terça-feira, 21 de agosto de 2012

Praga de mãe



O menino era o filho mais novo. Por volta dos 10 anos, perdeu o posto de caçula. Sua mãe, caminhando no campo, encontrou um bebê abandonado e ferido. A criança tinha o crânio amassado por quem tentara matá-la, antes de se desfazer dela. Mas foi encontrada, salva e acolhida. O menino a viu chegar à sua casa, ser cuidada, tratada, ganhar novo fôlego, respirar para a vida. No entanto, os sinais da tragédia permaneceram: a menina ficou com uma leve sequela, além de ter as feições deformadas pela cicatriz óssea.

O menino nunca aceitou plenamente a perda do lugar de caçula para a irmã adotada, e frequentemente andava às turras, resmungando o fato da mãe preferir a menina a ele. Gostava cada vez menos dela. Revoltava-se cada vez mais amiúde. Até quando, já adolescente, tendo brigado com ela, declarou à mãe: “Não entendo porque a senhora prefere, mesmo, essa menina feia e imperfeita!” A mãe, já cansada de tentar contemporizar a insatisfação do filho, respondeu impaciente: “Um dia você vai casar, e vai ter um filho feio e imperfeito!

Foi uma condenação. Desde aquele dia, começou a sofrer, temendo o que o futuro poderia lhe reservar. Decidiu que não se casaria. Mas quando ficou moço, e se apaixonou, mudou de ideia: arriscou-se a casar. No entanto, temia o dia em que sua esposa pudesse ficar grávida. Ficou. A gestação correu normalmente. Quando o bebê nasceu, ficou aflito. Olhando pela janela do berçário, avistou uma sombra no rosto do menino. Concluiu que era uma imperfeição. Saiu desesperado, ao encontro do médico. Foi difícil convencê-lo que a criança não portava nenhum problema.

Mais tarde, contou para a mãe o ocorrido, e o alívio ao constatar que seu filho nascera bem. A mãe assustou-se, pois sequer se recordava de ter feito tal afirmação. Choraram, ali, mãe/avó e filho/pai, abraçados, desfazendo todas as angústias que pudessem ter permanecido no decurso do tempo.

A mãe/avó retornou para casa, onde a filha adotiva, feia e imperfeita, a aguardava. Companheira certa, afeto interminável.



Um comentário:

  1. É impressionante o poder de cada palavra e a interferência desta na vida. [sorrio]
    Parabéns pelo blog e pela postagem! Prazer estar aqui! Com tempo, venha ler e comentar INFAUSTA CORRIDA no http://jefhcardoso.blogspot.com
    Abraço!

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