quarta-feira, 31 de agosto de 2011

pequenos recortes de saudades





Rodoviárias...


As elites (e aqueles que se abrigam nas suas sombras...) não são afeitas às rodoviárias. Tampouco aos seus usuários.

No plano original, Brasília tinha uma única rodoviária, bem no centro, onde o Eixo Monumental e o Eixo Rodoviário se cruzam, tendo a máquina de Estado de âmbito federal, com a Esplanada dos Ministérios, o Congresso e os Palácios da Justiça de um lado, e a Torre de TV, e toda a estrutura do Governo do Distrito Federal do outro.

Dali daquele ponto zero, saíam os ônibus urbanos, e os interurbanos, aqueles cujo destino era logo ali, e os outros cuja viagem só findaria depois de dois dias na estrada. No início dos anos 80, parti, dali, para muitos pontos no país, entre eles, São Paulo e Recife.

Mas logo a demanda aumentou muito, e os fluxos se tornaram muito mais intensos do que a estrutura física suportava. Então retirou-se a parte dos ônibus interurbanos para a antiga Estação Ferroviária, que passou a se chamar Estação Rodoferroviária. No centro, ficaram apenas os ônibus de circulação urbana - inevitáveis, para pesar das estruturas de poder então instauradas...

Na Estação Rodoferroviária, ainda havia movimento com o trem de passageiros, que ligava Brasília a Campinas, além dos trens de carga. Por isso, ao espaço para embarque e desembarque de passageiros dos ônibus foi designado o subsolo. Os ônibus vinham pela via, e mergulhavam por baixo da construção. Lá, num túnel pouco iluminado, acotovelavam-se passageiros e seus acompanhantes, gente que veio se despedir ou acolher as gentes que partiam ou chegavam. Resfolegavam o ar impregnado de monóxido de carbono emitido pelos motores dos ônibus, em funcionamento. Além disso, tinham que enfrentar longas escadarias com toda a bagagem acima, ou abaixo, pois nem sempre as escadas rolantes estavam funcionando. E os carregadores de bagagem se esbaldavam com a situação.

Com a interrupção do transporte de passageiros pelas vias férreas, a plataforma superior passou a ser ocupada pelos ônibus e seus passageiros, libertados da caverna. Mas a estrutura da Rodoferroviária já estava muito deteriorada, com infiltrações, pequenos desabamentos, muita sujeira... Além do que, a plataforma superior era desprotegida, deixando seus usuários vulneráveis aos ventos, chuvas, frio, e toda sorte de intempéries. E violência.

Durante mais de duas décadas, enquanto a elite chegava e saía da cidade pelo aeroporto, a população, que move a cidade quotidianamente enfrentava a travessia da Rodoferroviária para chegar e partir.

Durante mais de duas décadas prometeu-se a construção de uma rodoviária digna para os habitantes da capital federal.

Finalmente, para marcar os 50 anos da cidade, construiu-se a nova Rodoviária interurbana! Ao lado de uma estação do metrô, nas cercanias de um grande centro de compras, um hipermercado, às margens do anel rodoviário da cidade. Tudo parecia concorrer para não só para a solução dos problemas, mas para a melhor delas.

O chão com pedra polida rebrilha sob as rodinhas das malas e outras bagagens; num painel imenso uma fotografia panorâmica da cidade encanta os visitantes, animados em fotografar a fotografia. Algumas poucas lojas cobram preços exorbitantes pelos seus itens disponíveis aos consumidores-viajantes. E começam, aí, a aparecer os problemas em nova versão...

A estrutura física da nova Rodoviária é leve, e parece querer escapar à função que lhe foi atribuída, voando para o alto. Com as bordas mais altas, e rebaixada ao meio, as áreas de embarque e desembarque são vulneráveis às intempéries do clima... Em períodos de festas, quando há maior movimentação, falta espaço para que os ônibus possam estacionar para os desembarques. Forma-se uma fila que se estende até à via do anel rodoviário, fora da área da Rodoviária. O trânsito tumultua-se, por que o estacionamento para o público em geral também é pequeno, insuficiente. As vias de acesso são confusas, obrigando o usuário a fazer muitas voltas, caracóis entrelaçados, até acabar de chegar, ou sair. O estacionamento é cobrado por hora, e a tolerância, na entrada, é de apenas 5 minutos. A taxa de embarque, para os que partem, é paga em separado das passagens, em dinheiro vivo, sem recibo ou nota fiscal. As roletas eletrônicas, que deveriam computar o número de passageiros em trânsito, não funcionam. A violência urbana também já se instalou ali também, e não se vê a presença de policiamento e outras formas de proteção aos usuários. Finalmente, a vizinhança com o metrô, que facilitaria o deslocamento dos chegantes, mostra-se uma novela à parte: o usuário, portando suas bagagens, deve seguir por uma passarela incapaz de protegê-lo sol, da chuva, do vento; ao final da passarela, deve descer um pequeno conjunto de degraus, atravessar a rua movimentada em mão dupla, subir uma longa escadaria, para só então ter acesso à estação.

Em tempo: a estação do metrô e o centro de compras são interligados por uma passarela suspensa, totalmente protegida, com vista panorâmica, pela qual os consumidores podem ir e vir, com suas sacolas cheias de mercadorias...


terça-feira, 30 de agosto de 2011

água de poço


Nestes dias quentes, recorrentemente me lembro da água fresca retirada do poço, no balde transbordante. Eu o depositava no bocal. Depois enfiava o rosto na água, e ficava bebendo aos pequenos goles, ali, mergulhada. Saciada, levantava a cabeça, respingando frescor pelo corpo e no chão à volta.

Esse mesmo poço, no inverno, oferecia água morna, pronta para ser usada, a despeito do frio intenso.

No poço da casa de minha infância, a água tinha sempre uma temperatura agradável ao corpo dos habitantes. As oscilações da temperatura não tinham influência sobre ela.


segunda-feira, 29 de agosto de 2011

um par de óculos e um mosquito


Cheguei um pouco cedo. Acomodei-me num banco para ler um pouco, enquanto aguardava o ônibus. Distraí-me entre os escritos, até que ouvi um estalo forte, e alguma coisa caiu perto dos meus pés. Avistei um par de óculos, com uma das lentes desencaixada. Como viera parar ali? Olhei à minha direita e me deparei com um senhor de meia idade olhando para os óculos, com uma expressão que misturava indignação, raiva, e humor. Estranha mistura. Então lhe perguntei: "Esses óculos são seus?", enquanto tratava de apanhá-los para lhe entregar. Ao que ele me respondeu: "Fui bater num mosquito que estava me incomodando, e veja o que eu fiz!" Foi logo reencaixando a lente solta. Comentei, ainda: "Sorte que a lente não quebrou...". "São orgânicas, não quebram..." Já recolocara os óculos, e voltara à expressão de espera, muito comum em pessoas que aguardam ônibus, sozinhas, nas rodoviárias...


domingo, 28 de agosto de 2011

sobre conformação dos pés, calçados, e outras torturas...



Normas sociais modelam os corpos.

Por volta do século V, instalou-se, na China, por meio de éditos imperiais, a tradição dos pés enfaixados, também chamados de pés de lótus. Esse costume estendeu-se até a Revolução, no século XX. Meninas, desde a idade tenra dos seis anos, eram submetidas a processos torturantes, nos quais seus pés tinham a anatomia violentamente alterada, para permanecerem pequeninos. Em tese, pretendia-se que, assim, chamassem o interesse de bons partidos para casamento, por despertarem a libido masculina. De fato, era-lhes limitada a capacidade da mobilidade. Na idade adulta, essas mulheres mal conseguiam equilibrar-se em pé, precisando sempre de auxílio em seus deslocamentos. Frágeis, dedicavam-se, entre os afazeres possíveis, a confeccionar delicados sapatinhos bordados para seus pequeninos pés com forma de flor de lótus... 

Tal prática causa, hoje, sentimentos de repúdio e horror, sobretudo entre as mulheres ocidentais, emancipadas, senhoras de seus próprios corpos, herdeiras das manifestações por liberdade ocorridas nos anos 60 do século passado, das narrativas sobre os sutiãs queimados em praça pública, dos métodos contraceptivos cada vez mais precisos e eficientes, com menos efeitos colaterais.

No entanto, caminhando entre vitrines dos centros de compra, observo os calçados masculinos e femininos da moda, e constato alguns aspectos desses artefatos - vinculados a práticas sociais e traços da cultura contemporânea - que me instigam a pensar sobre essas questões. Ressalta o fato de que os sapatos masculinos têm o conforto como fator-chave, enquanto os sapatos femininos, numa variação muito mais extensa de modelos, formatos, materiais, têm como elemento principal a capacidade de chamar a atenção pelo formato externo, à revelia do que imponham aos pés de quem os possam calçar.

Os saltos muito altos forçam a anatomia feminina a um novo posicionamento ortopédico, alterando-lhe o modo de caminhar, a postura, e as relações de força que envolvem estrutura óssea e musculatura responsáveis pela deambulação. Dizem, os que ditam a moda, os fabricantes dos calçados, e seus vendedores (em sua maioria homens), que o salto alto imprime elegância à postura da mulher. E elas acreditam. Ao calçá-los, o peso do corpo concentra-se na região próxima aos dedos dos pés, acentuando o arco, e forçando a abertura da articulação do tornozelo. A musculatura posterior da perna se encurta. No decorrer do tempo, com o uso continuado, essa musculatura já não se alonga mais, o que implica numa disfunção  anatômica. Mas a usuária inadvertida argumenta que, na verdade, os saltos lhe descansam as pernas, enquanto que calçados baixos causam dores. As articulações também se ressentem no decurso do tempo, desenvolvendo artrites e tendinites as mais diversas.

Mas os calçados com saltos altíssimos não saem da moda, fazendo circular lucros, impondo padrões deformantes à anatomia feminina, em atenção ao chamado do fetiche masculino. Os saltos altos, aliados aos bicos finos, repetem o posicionamento dos pés femininos das mulheres chinesas, preservando-lhes, apenas, o tamanho...



   



Estendendo um pouco mais a questão, pergunto, ainda, sobre quais as reais diferenças entre os procedimentos agressivos nos pés das chinesinhas e os procedimentos cirúrgicos por meio das quais se pretende conformar os corpos femininos a certos padrões pretendidos de beleza, e consequentemente de aprovação social?

No contraponto a esse quadro, recordo que as mulheres mamaindê fazem longas caminhadas pela mata, com seus pés descalços, sentindo o terreno que pisam, firmes e ligeiras em suas passadas. Aprendi com elas que os pés sutilmente girados para dentro dão maior equilíbrio, e ajudam nas subidas e descidas em terrenos mais íngremes. A essa lembrança opõe-se outra. Era adolescente, quando acompanhei uma amiga já adulta na compra de um par de sandálias caríssimo, muito elegante: saltos muito altos e tiras delicadas, muito estreitas, douradas. Ela me explicou que aqueles calçados não serviam para situações que exigissem maiores caminhadas, mas para ficar elegante, e encantar o namorado. Ela os usaria tão somente para percursos entre a casa e o carro, depois até o restaurante, ou a sala de cinema, ou o teatro. Sempre trajetos curtos.

Dito isso, calço minhas sandálias rasteiras, sinto-lhes o conforto nos pés. Vou percorrer caminhos e calçadas que atravessam a manhã cheia de sol, e degustar esse prazer...

Viva a ergonomia! Que tenhamos um bom domingo!





quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Mostra de Cinema Martins Muniz e Sistema CooperAÇÃO Amigos do Cinema





Martins Muniz faz parte de uma legião de apaixonados pelo cinema que não se contenta em consumir as histórias disponíveis no mercado de entretenimento e cultural. Precisam contar suas próprias histórias como condição de preservar a sanidade estética, artística, sensível. Mas o fazem sem se submeter aos ditames dos mercados vigentes da arte, do cinema, da indústria cultural.

No caso de Muniz, seus filmes são realizados a baixíssimos custos, e a produção é garantida pela ação coletiva de artistas, amigos e simpatizantes, que atuam, contribuem com locações, filmagens, figurino, objetos de cena, e tudo o mais quanto necessário. Mas o necessário, do ponto de vista material e de infraestrutura, parece pouco, se for considerada a força principal que este cineasta consegue mobilizar: o sentido da ação coletiva, a colaboração, a solidariedade com vistas a se contar histórias com imagens em movimento e sonorizadas.

Exatamente por isso, Martins Muniz repreende quem queira atribuir a ele o mérito da realização do conjunto de filmes que dirigiu: “Eu não, é o grupo, é o Sistema CooperAÇÃO Amigos do Cinema”. Desse modo, ele reitera o fato de que ninguém produz no cinema sozinho, mas numa relação fundamentalmente coletiva. Ainda mais: faz dessa postura sua principal bandeira de ação.

Seus filmes integram um tipo de produção marcada pelo caráter artesanal, humorada no modo de articulação dos elementos da linguagem e das condições precárias de realização. Os argumentos evocam costumes, histórias da cultura, a terra, as gentes, seus viveres, perguntas. O que lhes confere um traço etnológico, mesmo quando os argumentos sejam ficcionais.

Na Mostra de Cinema Martins Muniz e Sistema CooperAÇÃO Amigos do Cinema, o público tem a oportunidade de conhecer o conjunto da obra, em sessões diárias e gratuitas. Mais que isso, no dia 5 de setembro, após a sessão das 20h, tem a oportunidade de participar do debate, quando vários aspectos desse trabalho serão abordados, com a participação  de Marcela Borela, Leandro Cunha e Carlos Cipriano. 


Espero vocês por lá!


segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Um telefone celular e o reboco novo da casa



O pai aproveitava os horários livres para adiantar a reforma necessária na casa. Faltava ainda o piso da maior parte das peças, reboco nalgumas paredes, cerâmica no banheiro.

Enquanto isso, a mãe se virava como podia para manter a casa limpa, com os meninos brincando sempre por perto.

Quando o mais velho completou 11 anos, a avó deu-lhe um aparelho de telefone celular, que ele passou a levar para a escola. Em casa, ficava muito tempo entretido com os joguinhos.

Naquele dia, o mais novo resolveu que queria jogar, também, no aparelho celular do irmão. O mais velho não queria deixar, ou só deixaria depois de se cansar, ele próprio, de jogar. Então começaram a brigar. Intriguelha de irmãos. Queixas, resmungues. A mãe, irritada, com tanta coisa para fazer, resolveu tirar dos dois o tal aparelho celular. Onde colocar? Desligou-o, e o escondeu ali, num vão entre dois tijolos, na parede sem reboco. Analisou o encaixe, e empurrou mais ao fundo, para assegurar que eles não o encontrassem antes que ela mesma decidisse devolvê-lo.

No dia seguinte, muito cedo, os meninos saíram para a escola, e ela seguiu para o trabalho. O marido aproveitou um momento de folga, e o pouco movimento dos moradores na casa, para adiantar o trabalho. Rebocou as paredes, inclusive aquela onde o telefone estava escondido...

Ainda hoje, nalgum ponto da parede - ela não se lembra ao certo... - está o telefone, bem guardado. Sem o risco de ser perdido. Tampouco de ser usado... 


sábado, 20 de agosto de 2011

Pipas de agosto na FAV, edição 2011, sessão do dia 19, fim de tarde

No fim da tarde, o vento estava fraco. Pelo menos nas pequenas alturas.
Então os meninos ficavam à espreita. Quando batia uma lufada de vento, corriam. O desafio era fazer com que a pipa alcançasse as regiões mais altas, onde havia mais vento. 
A primeira fase, então, foi de conversar, esperar, prestar atenção, e, nas horas certas, começar a correr, dando linha para fazer a pipa subir. Coisa para quem sabe...













Mas houve quem não tenha sofrido tanto. A pipa com melhor aerodinâmica  bem cedo já estava lá no alto, bailando ao vento... e seu senhor e proprietátio, em solo, só fazendo de conta que estava fazendo um esforço... 

 Aos poucos, e com a determinação dos meninos, as outras foram ganhando os céus, lindas!



 

Inclusive a que eu fiz, na oficina com o Glayson...






Empinar pipa, pandorga, arraia, papagaio, é bom para quem corre, segura linha, dá linha, e também para quem só fica olhando...





A Ju comparou com pescaria. A principal diferença: na pescaria, a linha vai para baixo, para dentro da água, brincando com pipa, a linha vai para cima, para dentro do céu...
Pois não é que duas das pipas tremulando no céu tinham o formato de peixe?



Peixão!

 

Já era noite, e estávamos lá, brincando, sem muita vontade de encerrar a festa... 
 foto: J. Bamberg

 foto: J. Bamberg

foto: J. Bamberg

Aconteceram acidentes, também...
A pipa que o Cleomar fez caiu na árvore, a seda rasgou-se, sobraram as varetas de bambu... Depois, o peixão dele, o primeiro a subir às alturas, de repente deu um mergulho em direção à matinha... deve estar lá, engrimpado na copa de alguma árvore. O Renato bem que tentou achar, mas já estava muito escuro, noite avançando. Ainda precisamos recuperá-lo...



No mais, foi só alegria!
Obrigada, meus companheiros de festa!


sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Almanaque do Pensamento, e as chuvas



Todo início de ano, minha mãe compra o exemplar do Almanaque do Pensamento. Há muitas décadas. E também me dá um exemplar, e aos meus irmãos.

Hoje ela me falou, ao telefone, com serena certeza: “Até o final do mês, vai dar uma chuva geral”. E fez umas contas: "Lá pelo dia 29, tem mais 10 dias prá gente aguentar a seca. Mas vai já passar..." Chuva geral? Final do mês? Mais 10 dias? Onde a senhora viu isso, minha mãe? “Li no Almanaque”, e riu-se.

Nunca antes eu desejei tanto acreditar no Almanaque da minha mãe...



terça-feira, 16 de agosto de 2011

Eu preciso brincar!



Foto: Cleomar Rocha   


Não adianta insistir: eu não vou fazer outra coisa:

Quinta feira à tarde, tem Oficina de Pipas, com o Glayson Arcanjo.

Sexta feira, do meio pro fim da tarde, quando diminuir um pouco o calor, a gente vai empinar!

Tomara que soprem bons ventos, suaves e firmes! Tomara que desta vez a minha suba e não faça mergulhos suicidas!


domingo, 14 de agosto de 2011

Oficina de Confecção de Pipas



Nesta quinta feira, dia 18, as 14h, Glayson Arcanjo ministrará uma oficina de Construção de Pipas, para que depois as soltemos na sexta dia 19 no projeto PIPAS NO CÉU DA FAV, que acontece toda sexta do mês de agosto, as 16h30 no gramado da FAV-UFG. As vagas são poucas e limitadas! 

Material: 02 folhas de seda (com as cores que quiser sua pipa), um carretel de linha de pipa, cola e tesoura, sacolinhas de plástico de supermercado.

Organização: PIPAS NO CÉU da FAV + Grupo DESENHA!

Glayson, super obrigada!




sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Oráculo pós-moderno, discípula rebelada



Na era em que a palavra de ordem é a comunicação e as redes de compartilhamento de conhecimento, informação, experiências artísticas, acervos culturais, processos de socialização, entre outros, os centros gerenciadores dos sistemas de comunicação assumem papel central na vida dos cidadãos, regendo-as em boa parte. É nesse cenário que os call centers, os centros de telemarketing, os sistemas de atendimento por telefone, além das páginas de internet destinadas ao relacionamento com o cidadão, nos portais de empresas que negociam os mais variados itens, ocupam lugar inevitável para o encaminhamento de quantos itens do quotidiano contemporâneo: da mercadoria danificada entregue pelos serviços de correio, ao serviço de reclamação do consumidor; dos pacotes de serviços oferecidos por redes bancárias a cidadãos que não os pediram, à contratação de seguros de vida, de carro, de imóveis, e outras providências; dos canais das redes de televisão a cabo, aos serviços de telefonia e rede de computadores.

Cada cidadão que transite pelas ruas dos centros urbanos, e mesmo os que se distanciam nas regiões rurais, rendem-se diariamente ao culto que devem aos novos oráculos, que lhes custam caro, com valores desdobrados em prestações intermináveis. E os portais de atendimento tomam a forma de rituais sofisticados e misteriosos, que se, por um lado, anunciam a intenção de resolver questões aos consumidores, e garantir sua satisfação (o que é altamente duvidoso...), por outro lado os mantêm à distância, sem acesso direto ou indireto a sacerdotes e sacerdotisas, e aos representantes da transcendência pós-moderna, os que ocupam os postos mais altos das hierarquias dessas neo-religiões.

De minha parte, confesso uma incompetência que não tenho sido capaz de superar, e da qual não tenho conseguido me livrar: a de me relacionar com esses oráculos. Toda vez que sou levada a consultá-los, por telefone ou internet, sou impregnada dos sentimentos de impotência e raiva, que me empurram à desrazão. Invariavelmente, vejo-me incapaz de compreender e me fazer compreender – o que é condição, aliás, para que qualquer circunstância comunicacional ocorra. Os protocolos são fechados, neles não cabem questões não previstas – por eles – e, a cada passo, ocorrem mais imprevistos do que situações previstas. Os atendentes – noviços das diversas seitas dominantes – só sabem dar (ou só seriam autorizados a dar...) uma resposta para uma questão. Todo desvio deve ser direcionado para outro setor, e as chances de novos direcionamentos são sempre grandes. Da mesma maneira, são grandes as possibilidades de que não se consigam resolver os problemas. Estes, por sua vez, sofrem expansão significativa quando o assunto está no campo da própria telefonia, atendido nos portais telefônicos...

No meu sonho, o Paraíso é um lugar sem portais para atendimento aos consumidores por telefone ou por internet. A comunicação entre as pessoas é direta, interlocutores olham-se nos olhos, ouvem-se as falas reciprocamente. Em espaços abertos, negociam-se prioridades, desejos, interesses, devaneios... É possível, mesmo, que nem se tenha inventado, ainda, a energia elétrica...



quarta-feira, 10 de agosto de 2011

O poder num aceno da mão



Eu deveria ter por volta de uns 5 anos. Toda vez que íamos da fazenda para a cidade, ficávamos à beira da estrada, aguardando a jardineira. Quando ela apontava, no horizonte, eu ficava ansiosa, agitada. Em alguns instantes ela se aproximava, e minha mãe me afastava da estrada, enquanto meu pai acenava, para que ela parasse. O gesto de meu pai era seguro, largo. E o motorista acionava os freios, parando para que pudéssemos embarcar.

Meu desejo era também fazer parar a jardineira, apenas com o aceno da mão. Quando pudesse fazer isso, já seria forte o bastante para encarar o mundo. Mas esse tempo se demorava a chegar, e minha mãe sempre me afastando da estrada no momento exato!

Num início de noite, na cidade, voltávamos a pé para casa. Minha mãe e minha irmã conversavam, e eu ia, pulando, à frente. Quando me dei conta, havia me afastado delas um pouco mais, e avistei um carro que se aproximava de nós. Não tive dúvidas: a hora era chegada! Parei à beira da via, e executei o gesto tantas vezes repetido por meu pai, sob minha atenta observação. Não me contive de alegria quando o carro parou! Eu dominava o código, e tinha o poder!

Minha mãe correu, pediu desculpas ao motorista, justificou que era arte de criança, me olhou com ares de repreensão, e me trouxe de volta para perto dela. Eu me sentia um pouco maior do que era de fato. E degustava a conquista.


domingo, 7 de agosto de 2011

Pipa à deriva... ou quase

Para Cleomar

Nota: aumentar o volume do som


O menino correu, soltando a linha, e logo a pipa alcançou regiões com boas correntes de vento. Ficou lá, tremulando no céu de fim de tarde. Então o menino prendeu a garrafinha, onde amarrara a ponta da linha, e foi apreciá-la, de longe. Melhor, foi me ajudar a empinar a minha, que é desajeitada, e teima em não subir. Até que ele conseguiu: minha pipa subiu até certa altura, mas depois embicou para baixo, e fez um mergulho quase suicida. Frustração, a minha. Foi quando nós dois olhamos, e a pipa dele estava indo embora: deslocava-se rapidamente, cada vez mais alta, cada vez mais longe. A certa altura, deixou de se afastar, e ficou ali, fazendo um oito imenso no céu. Repetindo o sinal de infinito, na beira do infinito...

Era de se supor que a garrafinha tivesse se enroscado em algum lugar. O menino correu, correu, com o coração a sair pela boca, até encontrar a garrafa ancorada ao transformador de alta tensão de um poste de luz! Além disso, a linha estava enroscada numa árvore vizinha. Ficamos os dois ali, olhando a pipa voando, e a garrafinha no poste. O que fazer? Se cortássemos a linha, a pipa estaria perdida para sempre. Se a deixássemos ali, quando o vento cessasse, ela cairia nas mãos de alguém que não um de nós dois.

Quando duas pessoas ficam olhando muito para o céu, logo a elas se reúnem outras pessoas também a olhar na mesma direção. Foi o que aconteceu. Entre esses, estava o nosso herói, mestre em questões relativas a pipas, arraias, pandorgas, papagaios, e congêneres. Desses meninos que já nascem com taboca, papel de seda e linha 10 na mão. Ele pegou a minha linha, amarrou a ponta numa chinela que encontrou ali por perto. O menino da pipa segurou a garrafinha onde a linha estava enrolada, o mestre atirou a chinela por cima da linha que sustentava a pipa. Depois, foi trazendo para si a linha, aos poucos, com cuidado, para não cortá-la com o atrito. Já com a linha da pipa na mão, iniciou a segunda fase do resgate, e a mais admirável, no quesito habilidade no manejo da linha. Ele foi tracionando a linha, e puxando a pipa, até conseguir desenroscá-la da árvore. Depois, continuou controlando seus movimentos, de modo que não se enroscasse mais no poste, ou nas fiações. Até que ela veio ao chão.

Já era noite, e a lua brilhava no céu.

sábado, 6 de agosto de 2011

a falta que as chuvas fazem...


... todo mês de agosto adentro, no Planalto Central, tenho a sensação de que não chove há uns 200 anos...
mais que a vegetação, a pele e as mucosas, mais que o ar sem densidade, o sopro que aviva a alma se resseca...
quando as chuvas voltarem, vou celebrar.
quem quiser, venha comigo!





segunda-feira, 1 de agosto de 2011

arco-íris


Na manhã de inverno sem chuvas, microgotinhas de sereno refratam a luz do sol na teia enovelada entre folhas de grama.