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sábado, 20 de janeiro de 2018

Em edição...



Foto: Renato Cirino


Mais um filme do Sistema CooperAção Amigos do Cinema sendo realizado.
Roteiro, Produção e Direção: Alice Fátima Martins
Assistentes de Direção: Lara Satler, Renato Cirino
Fotografia: Lara Satler, Renato Cirino e Fábio Rocha
Grande equipe técnica e elenco de estrelas luzidias. 
Aguardem!






sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

João da Estrada





No domingo, eu me atrasei. Quando cheguei ao local de filmagens, para fazer o still, quase todos já estavam a postos, organizando o espaço, fazendo marcações, decorando texto. Além do grupo de atores, e dos técnicos que operam equipamentos, gravam, cuidam do som, luz, etc., achegam-se também outras gentes: uns tratam de fazer registros do processo, outros observam, curiosos, outros conversam à volta. Eu não conhecia todos ali. Foi assim que fiquei sem saber a qual categoria aquele homem pertencia: amigo de alguém? curioso? artista excêntrico? Entre o movimento, ele observava, com mansidão, e eu o observava. Meus olhos teimavam em buscá-lo. Eventualmente, ele acompanhava as gravações lendo algum roteiro deixado à mão. Discutiam-se as cenas, modificavam-se sequências, repetiam-se as tomadas. E ele ali. Depois todos se reuniam para verificar o que havia sido gravado, e certificar-se de que não seria necessário fazer mais tomadas. Ele acompanhava o grupo. Mais tarde, terminados os trabalhos, foi servido o almoço. Momento de celebração coletiva, da qual ele tomou parte, respeitosamente tirando o gorro. Só mais tarde eu pude confirmar que, de fato, ali ninguém o conhecia. Chegara logo no início da manhã. E permanecera, integrado ao movimento das pessoas, cada qual com seus próprios estranhamentos, de modo que acabou não se sentindo tão desigual. No meio da tarde, ele contava uma história mirabolante a uma pequena audiência. João da Estrada, passou a ser referido, depois do episódio. Andarilho. Seguiu seu rumo, que é qualquer um. Seguiu assim, sem documentos, deixando pouco ou quase nenhum rastro. Apenas esta imagem, entre as formas orgânicas do cerrado, criadas pelo querido Noé Luiz da Mota, na Catedral das Artes.




quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Metacinema e Os Mercenários



Um grupo de bandidos orientais (há alguma diferença entre bandidos e mercenários?...) tem um refém preso a uma cadeira, com as mãos para trás e um saco cobrindo seu rosto. O líder tortura esse prisioneiro, espancando-o, ameaçando-o de morte. Mas ele nada fala, e não faz um movimento sequer. Parece desmaiado. À frente, um senhor oriental está deitado, ensanguentado. Parece vivo, ainda. Também é prisioneiro.

Enquanto isso, um grupo conduzindo veículos multifuncionais, blindados, armados por todos os lados, avança sobre o forte onde essa cena se passa. Matam tudo e todos quantos lhes cruzem o caminho, ou estejam, ao acaso, nas cercanias. Aos poucos, é revelada ao espectador a face de cada um deles: atores famosos de filmes de ação norte-americanos, todos reunidos na mesma produção. A maior parte deles já na meia idade, divertindo-se em fazer o de sempre: contar, no cinema, a mesma história. Divertem-se no percurso. Chegam, afinal, ao salão onde estão os dois prisioneiros. Depois de terem “limpado a área”, Stallone, o velho Rambo, líder do bando, revela o rosto do prisioneiro, tirando-lhe o saco da cabeça. É ninguém menos que Arnold Schwarzenegger, cuja fala primeira formula uma queixa quanto à demora dos parceiros. Em seguida, reivindica uma arma “bem grande”. Olha para Terry Crews, especialista em armamento pesado. Quero essa sua, grunhe. Terry Crews se recusa a lhe emprestar, mas Stallone intercede, sugerindo que ele use a de reserva. Terry, então ameaça Arnold, enquanto lhe entrega a preciosidade: Se você não devolver, eu extermino você! Nem no futuro, é a resposta de Arnold, numa referência ao filme Exterminador do futuro, Terminator no título original (o tradutor tratou de fazer uma gambiarra para encaixar a versão do título em português).

Os Mercenários, The Expendables, foi escrito por David Callaham e Sylvester Stallone. Este é, também, o diretor e assume o papel principal (papel principal?...). Com a primeira produção lançada em 2010, desde então o projeto emplacou 3 continuações. De fato, o papel principal não é de Stallone, mas do cinema de ação norte-americano. O mérito de Stallone foi reunir, na mesma produção, todos os caras maus que andam por aí, matando gente em nome da defesa sabe-se lá de quem ou do quê (além de seu próprio faturamento, é claro). Sempre sozinhos, lutando contra todos os bandidos do mundo, nessa versão do mesmo filme de ação norte-americano, eles resolveram reunir suas fúrias, sua sanha de matar, sua sede de limpar a humanidade de seus inimigos, e andam em bando, fazendo a mesma e única coisa que sabem fazer.

Mas o tempo é implacável até com esses caras. Os jovens que encaravam o mundo sem medo estão coroas. Stallone apresenta barbas grisalhas. Os corpos continuam musculosos, mas sem o viço de há algumas décadas. A pele já ressente dos tratamentos recorrentes. Contudo, eles parecem não se importar. Divertem-se recontando, em bando, a mesma história que cada um vem contando, há décadas, sozinho. Divertem-se, sobretudo, vendo suas contas bancárias ficando recheadas com os lucros resultantes dessa única história que sabem contar e, mais que isso, sabem vender como ninguém.

Um viva as membros do Sistema CooperAção Amigos do Cinema, que também andam em bando, fazendo filmes artesanais, sem custos, e se divertindo muito! Só não sabem vender...





segunda-feira, 1 de julho de 2013

Cinema Tupiniquim no TEDxUFG


Vou contar uma história para vocês. Mas antes, vou lembrar outra história, mais antiga, que começa lá pelo século 19, quando várias pessoas, em distintos países da Europa e da América andavam às voltas tentando inventar alguma maneira de gravar e projetar imagens em movimento. Esse era um sonho tão antigo quanto a própria humanidade. Pois bem: alguns aparatos foram inventados, mas foi no final do século 19 que dois irmãos, na França, conhecidos como Irmãos Lumière, inventaram uma engenhoca que ficou conhecida como cinematógrafo. Essa engenhoca registrava e projetava imagens em movimento. Um outro francês, Georges Méliès, viu no cinematógrafo a possibilidade de fazer mágica! Ele era ilusionista, especializado em encantar os públicos enganando a percepção. E compreendeu que o cinematógrafo seria um instrumento importantíssimo para criar ilusões. Mais que isso: com aquele cinematógrafo nas mãos, Méliès começou a contar histórias, mostrando lugares que não existiam, que nunca ninguém vira antes. Méliès passou a experimentar, criar, inventar, tendo às mãos quase nada além da engenhoca inventada pelos irmãos Lumière. Além de ilusionista e encantador, ele era um contador de histórias, e instaurou o que passamos a chamar de linguagem do cinema.
Já no final do século 20, a revolução digital para a produção de imagens popularizou o acesso aos equipamentos. As pessoas passaram a produzir fotografias, vídeos, filmes, coisa que antes seria impossível. Muitas pessoas, apaixonadas pelo cinema, começaram a contar suas próprias histórias. Eu tenho tido a oportunidade de conhecer algumas pessoas muito especiais, que se dedicam a essa paixão. Conheci o Seu Zagati, um catador de sucatas que construiu um cinema na periferia de Taboão da Serra, o Seu Manoel Loreno, o ex-servente de pedreiro que produz filmes no interior do Espírito Santo, Seu Simião Martiniano, o camelô que produz filmes em Jaboatão dos Guararapes, na Grande Recife. E assim eu retorno à história que vim contar a vocês.

Ela pode começar assim: Era uma vez, no coração de Goiás
Um grupo de pessoas muito diferentes entre si, ocupadas com afazeres muito distintos, que têm uma paixão em comum: o cinema. Por isso, essas pessoas reúnem-se, periodicamente para realizar filmes.

Essa trupe se chama Sistema CooperAção Amigos do Cinema. Uma trupe aberta aos sonhadores, sempre tem gente entrando, tem aqueles que já estiveram, e por alguma razão não podem estar mais. Mas serão sempre membros do grupo. E um dia poderão ser convocados novamente! E tem aqueles que sempre estiveram lá, dando sustentação ao projeto.
O princípio da cooperação é a marca do trabalho dessa trupe. Ou seja: os filmes são feitos com orçamento quase zero. A solidariedade, a colaboração são a garantia da realização. Cada um traz o que de melhor tem a oferecer. Cada qual busca uma roupa, uma ferramenta, uma ideia, uma solução para um desafio. Quando tudo é reunido, é sempre muito mais do que se poderia imaginar.
O coletivo é liderado por uma pessoa muito singular, muito especial



Esse é o cara! Não se assustem: esse cartaz foi feito para integrar o cenário de um dos filmes. Ele constava entre os procurados, numa delegacia. Procurado, por ser um encantador, um ilusionista dos pássaros selváticos que somos todos nós. Ele nos encanta, contando histórias, fazendo uso dos recursos do cinema. Ele reinventa os modos de contar as histórias, não importam as condições adversas. Diante de cada dificuldade, ele cria uma nova solução.
Esse é Martins Muniz, diretor de cinema, líder do Sistema CooperAção Amigos do cinema.


Se ele é procurado, eu fui encontra-lo aqui: num galpão entulhado de quinquilharias, onde ele transforma sucatas em sonhos. Martins Muniz já trabalhou confeccionando cenários para teatro, vitrines, carros alegóricos de carnaval e outros eventos. Suas mãos são capazes de recriar, do inimaginável, formas que encantam. Como esse tubarão flutuando perto do teto, por exemplo.


Ou com uma única câmera, um argumento na cabeça, e um grupo de pessoas dispostas a compartilhar com ele o seu sonho, é capaz de reinventar histórias que articulam questões sociais, humor, ação, diversão. Eu fui convidada a conhecê-lo o set de filmagem em 2011, e a partir de então integrei sua trupe, como aprendiz e apaixonada pelo trabalho do Sistema Cooperação amigos do cinema. Desde o primeiro dia, ele sempre me repreende quando eu me refiro a ele, individualmente. Sua resposta é: eu sozinho não faço nada. Somos nós, é o coletivo, é o grupo quem faz. Essa, uma de suas maiores lições. Embora eu sempre ressalte que sua liderança é fundamental nesse processo, como aquele que mantém o espírito colaborativo do grupo, e que sabe, como poucos, contar histórias.


O contador de histórias prepara o roteiro, verifica o melhor lugar onde as gravações podem ser realizadas, marca dia e hora, convoca a trupe. Mas o roteiro previamente preparado vai sendo modificado, de acordo com as condições que o grupo vai encontrando, com as pessoas que puderam comparecer, as ideias que vão surgindo. Corta, recorta, parte, reparte: uma parte do texto, outra. Um quebra-cabeças, um jogo de armar, em que prevalece a invenção e a alegria de brincar. Um cinema tupiniquim, como Martins Muniz mesmo qualifica. Um cinema que não pretende ser cult, ou intelectual, um cinema despretensioso, cujo projeto é contar histórias que dão testemunhos autorais de seu tempo, de suas visões de mundo. E fazer isso com o espírito lúdico, divertido, experimental.


É assim que cada um inventa uma solução para o que seja necessário: a imitação de uma tatuagem, um microfone de papel, uma roupa improvisada, um balaio, uma sombra, um reflexo, um muro, uma luz vermelha...


Uma sala qualquer transforma-se numa boate


O estacionamento ao lado vira ringue onde o bandido e o mocinho travam uma luta brutal 


A pastagem verde de alguma fazenda se torna floresta a ser desbravada, onde escravos lutam pela liberdade, num tempo indeterminado.


Tudo diante da lente de uma única câmera. Por isso, é preciso que se façam muitas tomadas da mesma cena. Repetem-se várias vezes, de vários ângulos, para que depois seja possível montar o quebra-cabeças da história.
Aqui, não importa o que falta, mas aquilo que dispomos para, a partir dali, dar forma ao que desejamos realizar. Ninguém espera que sejam dadas as condições: a gente inventa essas condições, e faz!
Motivados por esta criatura que, a despeito dos problemas de saúde, que não são poucos, mantém o espírito jovem, a vontade de realizar, de criar, o ânimo para desbravar imaginários, e reinventar os dias.  


Depois de gravadas todas as tomadas, Martins Muniz trabalha com a edição neste cantinho de sua casa: uma ilha de edição formada por um computador quase obsoleto, programas antigos, condições que continuam precárias. Algum impedimento em função disso? De modo algum! É exatamente aí que ele vai costurando sequência a sequência, resolvendo questões de continuidade, articulando falas, gestos, imagens de modo que a história faça sentido. Reinventando a própria história, seus ambientes, seu contexto.


Algum tempo depois, a trupe reúne-se, com seus convidados, outros curiosos, quem queira tomar parte, para degustar o trabalho realizado, numa celebração.Quando observo todas essas pessoas, dou-me conta de sua diversidade: são advogados, administradores, professores, artistas, atores, fotógrafos, músicos, curiosos, reunidos em torno do Muniz, para jogar, para contar histórias, para reinventar modos de ser e estar no mundo. Com pouco, com tão pouco. Olhando para essas pessoas, e olhando os trabalhos já realizados, posso afirmar que não há poder transformador maior do que a solidariedade, o espírito de colaboração, a amizade. O sentido de fraternidade.
Talvez o Sistema de CooperAção Amigos do Cinema não chegue a transformar o mundo, mas com certeza tem contado histórias de transformação do mundo, pelo sonho de um mundo melhor!

Filmes mais recentes
Em 2012, foi realizado o filme Fora de Padrão, o filme, cujo tema central é a homofobia.
Em 2013, foi realizado o filme Capitão do Mato, que trata da luta de escravos pela liberdade, e da instalação de quilombos no interior de Goiás.


Fecho minha fala, ao modo como Martins Muniz costuma encerrar seus filmes:

Esta é a história que eu trouxe para contar para vocês.
 Quem quiser, que conte outra!