sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Cada dia sem gozo não foi teu

Cada dia sem gozo não foi teu
Foi só durares nele. Quanto vivas
Sem que o gozes, não vives.
Não pesa que amas, bebas ou sorrias:
Basta o reflexo do sol ido na água
De um charco, se te é grato.
Feliz o a quem, por ter em coisas mínimas
Seu prazer posto, nenhum dia nega
A natural ventura!

Fernando Pessoa - Poemas de Ricardo Reis.






terça-feira, 21 de dezembro de 2010

A Árvore de Natal de minha infância


Na casa de minha infância, não havia celebração específica para o Natal. Era um feriado entre os tantos do calendário anual, marcado pelo fato de que os meus irmãos, quase sempre, retornavam, em férias, para passar alguns dias – poucos – conosco. Talvez o mistério que envolvia o lugar desconhecido de onde vinham impregnasse mais o meu imaginário, ao final do ano, do que propriamente a ideia do Natal ou do Ano Novo.


Nesses dois dias, era suspensa uma parte dos trabalhos de rotina. Mas havia outra parte que não se podia interromper, o que incluía os cuidados com os animais e as plantas. A vida seguia rotineira, portanto, apenas levemente tingida por uma ênfase um pouco maior no sentido de fraternidade e solidariedade que deveria nos ligar aos demais seres viventes.

Numa dessas viagens de volta à casa materna, minha irmã – que sempre portava novidades da cidade grande – trouxe uma caixa cheia de enfeites delicados para fazer uma árvore de Natal. Eram bolinhas de vários tamanhos, algumas estrelas, e outros pequenos objetos coloridos. Todos feitos de um material mais fino do que casca de ovo, e tão facilmente quebrável, que era de se admirar que ela tivesse viajado com aquele pacote mais de mil quilômetros, de ônibus, sem ter quebrado nenhum.

Eu aprenderia, então, a fazer uma Árvore de Natal. Escolhemos um belo galho seco de goiabeira, e o fixamos numa vasilha preenchida com pedras, que posteriormente minha mãe envolveu com uma cartolina pintada com tinta prateada. A mesma tinta com que cobrimos, cuidadosamente, cada segmento do galho seco, do caule mais grosso, às terminações mais finas. Depois começamos a dependurar os enfeites trazidos pela minha irmã. Juntei a eles, minha coleção de cascas de cigarras, que eu recolhera na última primavera, quando elas despertaram do subsolo, subindo aos troncos das árvores para deixarem os casulos, e conquistarem o espaço com seus trinados. Lembrei-me, também, de algumas pequenas bromélias secas que eu trouxera da mata, e de barbas-de-pau, e outras flores secas que foram sendo distribuídas pela árvore.

Acho mesmo que essa Árvore de Natal nunca foi declarada pronta, pois íamos encontrando coisas, e inventando outras para enfeitá-la, ao longo do tempo. Ela nunca foi desmontada, durante todos os anos da minha infância, e parte da minha adolescência. Estava sempre lá, no canto da sala, com espaço para abrigar mais algum objeto, ou flor, ou galho, ou qualquer outro item que nos ocorresse acrescentar-lhe.

Ela abrigava, também, outras formas de interações, por assim dizer. De uma feita, o gato entrou na sala, e encantou-se com todos os gatos que enxergou, um em cada bolinha dependurada na árvore. Deu um leve tapinha em uma delas, que balançou. Gostou de mexer com outra próxima, para, ao final, pular na árvore, tentando espantar os novos concorrentes que lhe apareciam. A árvore caiu-lhe por cima. Muitas bolinhas se quebraram, e ele saiu correndo dali, assustado. Mas a árvore parecia já ter vida própria: retornada à sua posição original, rapidamente se cobriu com outros pequenos objetos, e já não se sentia falta do que se houvesse perdido no incidente com o gato.

Depois que eu também segui para estudar distante dali, e meu pai partiu, deixando-nos, e minha mãe veio juntar-se às filhas, a casa de minha infância ficou guardada por outras mãos, e a Árvore se perdeu, nem sei em que circunstâncias...

Mas é como se ela tivesse sido plantada no próprio sentido de Natal que pulsa em mim, e passa longe das correrias de compras, das excitações em função dos festejos, roupas, viagens, estradas concorridas, rodoviárias e aeroportos lotados...

Basta-me uma bromélia em flor, o trinado dalguma cigarra temporona, um casal de curucacas cruzando o céu entre a cidade e o campo, uma pausa para recobrar o fôlego, um abraço fraterno, o calor de um afago, para reencontrar o sentido mais humano do viver...


domingo, 12 de dezembro de 2010

Um Vaqueiro na Universidade

O Vaqueiro vestiu seu paramento de couro, mostrou sua bagagem, seus retratos, trouxe notícias do sertão da vaquerama, falou do Brasil de dentro, lembrou suas gentes e suas histórias, alinhavou algumas de suas memórias.
Emocionou-se com as saudades, e emocionou os presentes.





domingo, 5 de dezembro de 2010

Sessão nostalgia...

Na terra de minha infância, nesta época do ano, os pés de guavira, depois da florada, enchiam os campos com suas pequenas frutinhas verdes que estouravam entre os nossos dentes sua polpa doce, deliciosa. 
Depois, a paisagem foi modificada definitivamente pelos maquinários agrícolas que começaram a chegar, pelas plantações de soja que avançaram sobre os campos e as matas, pelos silos que armazenam as colheitas...
Durante algum tempo eu, criança, recolhia as raízes dos pés de guavira, nos campos arados, para alimentar o fogo, como lenha. Eram grandes, densas... Não me dava conta de que estava testemunhando a sua extinção, na região. Acabaram-se os pés de guavira no campo...
Vim reencontrar as guaviras no cerrado goiano, aqui, conhecidas por outro nome, não menos saborosas: gabiroba... 



Oh, quebra, quebra gabiroba
Eu quero ver quebrar
Oh, quebra, quebra gabiroba

Eu quero ver quebrar