A Joaninha e o Joãzinho viveram juntos muitos anos, e
tiveram duas filhas. Construíram uma casa. Mais tarde compraram um terreno numa
cidadezinha mais distante, com uma casinha. Alugaram a casa antiga. A labuta
era intensa. Ela trabalhava como empregada doméstica. Ele na prefeitura do
município. Ela acabou entrando para uma igreja cujo pastor passou a ter voz
muito presente na sua vida familiar e econômica. A vida a dois foi perdendo a
graça. Depois ficou desgostosa. Chegaram a se estranhar. Antes que acontecesse
alguma coisa pior, ele foi embora, deixando a casa e o terreno para ela e as
filhas. Acabou se juntando com uma moça, que não se chamava Maria. Era mais nova
que ele, moradora das redondezas. Logo tiveram uma filhinha. Não demorou, e todos
se tornaram amigos: a Joaninha, a nova mulher, as filhas mais velhas em torno
da recém-chegada, e as netas dele, que também já começavam a chegar. Durante um
punhado de anos, foi assim. A Joaninha, ainda trabalhando como doméstica, construiu
dois barracos no terreno da sua casa, e passou a alugar, abrindo mais uma fonte
de renda. As filhas adultas, casadas, cuidavam de suas vidas. O Joãozinho e a
nova mulher acompanhavam a filhinha caçula que ia crescendo em meio a todos. Até o dia
quando ele chegou de volta do trabalho, e encontrou a casa vazia: a mulher se
mudara, levando tudo da casa, num caminhão, mais a criança. Joãozinho ficou
atordoado. As filhas mais velhas o acolheram, e consolaram quando ele descobriu
que a mulher se mudara para poucas ruas acima, com outro homem, e andava bradando que ele nunca mais veria a filha, além de ameaçar processá-lo,
pois queria tomar tudo quanto fosse dele. A Joaninha, tomada de dores por ele, também lhe ofereceu acolhida. Ele acabou aceitando abrigo na antiga casa, com a ex-mulher. Mais
próximos, de novo, acharam graça no reencontro. Começaram a namorar. Mas o
pastor da igreja dela advertiu que não podiam ter intimidades antes de casar. Como
esse pastor demorou a autorizar que se realizasse o casamento! Celebraram as
bodas no domingo último. São os mesmos, mas também já não são. São os mesmos
pais das duas filhas, já adultas. Mas já são outros. Tanto tempo depois, já pouco
sabem um do outro. Mirando-se, começam a se reconhecer.
literatices... letras para nada, talvez para tudo... imagens de nada, que podem ser de tudo... matutações... penseros... rabiscações... daquilo que vejo... ou não... porque tomo assento neste tempo quando a humanidade produz vertiginosamente letras, símbolos e imagens, em busca de sentidos, quaisquer que sejam... ou não...
terça-feira, 28 de abril de 2015
quinta-feira, 23 de abril de 2015
Um pneu, um socorro e um gato no portal
Dei aulas o dia todo, das 8 às quase 18 horas. De volta para
casa, trânsito intenso, o pneu do carro furou. Estacionei ao lado de um sobradinho,
numa rua movimentada, meio escura. Respirei fundo. Ai, ai... Pedi, à seguradora, suporte técnico para trocar o pneu. Não, nenhum desejo de provar minha
autonomia feminina. Não trocando pneu de carro no início da noite... Posso fazê-lo de outras formas. Ali, o único desejo era o
de chegar logo em casa, e em segurança. Pelo telefone, fui informada que, no
máximo, em 30 minutos o auxílio chegaria. Fiquei dentro do carro, portas
fechadas, pisca alerta ligado. Notei que não havia pedestres transitando na
rua. Nem um para dar notícias dos outros. No sobradinho, diante do qual estacionei,
um cachorro latia nervosamente, e os proprietários me observavam, meio ocultos por
trás da janela. Alguns minutos depois, apareceu um gato, que se postou,
sentado, na calçada. Olhava sabe-se lá o que, concentrado. Em 15 minutos o técnico
chegou em meu auxílio, a bordo de uma moto. Quando ele já estava no domínio da situação, fazendo a troca dos pneus, avistei novamente o gato,
deitado na rua, rolando e roçando a cabeça no asfalto, ao lado do meu carro, bem
na linha do fluxo do trânsito. Aquela era uma espécie de demonstração de
domínio territorial. Mas era também um perigo iminente. Pisei firme no chão e o
adverti Sai daí, rapaz, não tá vendo o perigo? Venha p'rá cá!
Ele me olhou, resmungou, e veio se roçar no pneu do carro, me olhando e dando
breves miados. Logo voltou para a rua. Logo eu fui lá, empurrá-lo de volta. Afinal,
ele veio para baixo do carro, sempre me olhando, e se insinuando. Ri da figura.
Em alguma medida, senti-me protegida. Sabe-se lá porque. O rapaz foi ágil no
socorro. Liguei o motor do carro, o gato voltou para a calçada, o rapaz ficou,
na moto, aguardando que eu saísse. Findara o tempo. O portal fechou-se. Tudo retomou
o fluxo nervoso e veloz dos dias e das noites.
segunda-feira, 20 de abril de 2015
Aula de geografia, viajando pelo sudoeste de Goiás
Caiapônia
Palestina de Goiás
Iporá
Israelândia
São Luiz de Montes Belos
Firminópolis
Turvânia
Nazário
Santa Bárbara de Goiás
Trindade
Rodoviária de Campinas
Rodoviária de Goiânia
domingo, 12 de abril de 2015
terça-feira, 7 de abril de 2015
segunda-feira, 6 de abril de 2015
A sombrinha azul com ursinhos brancos desenhados na borda
Embora o atendimento na agência bancária, na parte da manhã,
tivesse sido ágil e eficiente (coisa que deixa a gente alegre), na parte da
tarde, na outra agência, demorou muito além do limite da minha paciência,
agravado pelas três filas que tive de encarar, e uma situação de discriminação
que acabei testemunhando. Mas, ao final, tudo acabou sendo resolvido, e cada um
seguiu seu destino. O meu, era a Secretaria de Cultura, para entregar a
documentação, conforme solicitado. No meio do caminho, o céu se dividiu em
dois: de um lado, sol; do outro, chuva intensa e alguns arco-íris que iam
pipocando, e desaparecendo com a mesma velocidade com que surgiam. Estacionei, sob
um temporal, com sol. Só então me dei conta de que tinha esquecido o guarda-chuvas
parceiro. No banco de trás do carro emprestado por minha irmã, havia uma
sombrinha dobrável. Peguei, para examinar. O tecido azul-piscina, delicado,
tinha uns ursinhos brancos pintados na borda. Observei a sombrinha, olhei para o lado
de fora, a chuva derramada, e pensei Isso
não vai dar certo... Fiquei ali, com a sombrinha na mão, sem saber ao certo
o que fazer. Por vezes, a chuva parecia ceder um pouco, mas voltava com mais
força. Encontrei uma sacola de plástico, onde pude abrigar os documentos e
minha bolsa. Na verdade, eu tinha mesmo era vontade de sair na chuva. Mas só
poderia fazer isso na volta, depois de ter resolvido as questões que precisava
fazer, na SECULT. Enquanto esperava, vários arco-íris desenharam-se ali, bem na
minha frente, entre o carro e o Teatro Nacional. Decidi confiar na sombrinha
azul com ursinhos brancos pintados na borda. O carro estava ilhado num espelho d’água. A
longa escadaria por onde fui descendo parecia uma cascata. Lembrei-me, rindo
sozinha, do passeio na chuva que eu e Lara fizemos, em Montes Claros. Decidi
que, na volta, não usaria qualquer proteção. Que a chuva me molhasse. Na
Secretaria, muitas pessoas aguardavam o estio, para encerrar o expediente. No retorno,
a chuva cessara, e o sol se duplicava nos alagados que se formaram. Meu banho
de chuva ficou para outro dia. A sombrinha azul da minha irmã teve trabalho
reduzido.
domingo, 5 de abril de 2015
Um filme ciberfunk documental cientificoficcional…
Fui assistir ao filme Branco
sai, preto fica, realizado em 2014, com assinatura de Adirley Queirós, uma
produção brasiliense, que contou com financiamento do FAC/DF e ganhou o prêmio
de melhor filme no 47º. Festival de Cinema de Brasília. Estava na expectativa
de ver o trabalho. Quando solicitei o ingresso, a moça me olhou séria e fez a
advertência: É um filme sobre música funk
da Ceilândia. É isso mesmo? Confesso que fui pega de surpresa. Apenas
respondi que Sim, é isso mesmo.
Depois que saí dali, fiquei pensando na situação discriminatória que isso
representou. O que a atendente teria pensado que justificou aquela advertência?
Eu, uma mulher branca, de meia idade, que interesse teria naquele tipo de
filme? Teria, ela, feito a mesma advertência aos demais clientes (pois a sala
estava com mais da metade das cadeiras ocupadas)?
Branco sai, preto fica
é um filme com a cara de Brasília, ou, do Distrito Federal, sua periferia. É um
filme que brada aos quatro ventos que a capital federal não se restringe à
Esplanada dos Ministérios, e suas gentes transitam por outros trechos do mapa.
De alguma forma, o filme brada contra a mentalidade manifestada pela moça que
me vendeu o ingresso, à entrada do cinema...
As tomadas são fortes, intensas. Fotografia cuidada, com
belas imagens. O argumento é muito interessante: trata das consequências de uma
tragédia, sem perder o humor, nem a ironia. Não deixa de registrar com
veemência a opressão dos anos 80, nos estertores da ditadura militar, e também
adverte para os riscos de outras ditaduras. É aí que a ficção científica ao
estilo ciberpunk (mas a música que
rola é funk...) dá o tom.
Por vezes, o ritmo ralenta. Nesses momentos, perde um
pouco da força. A finalização também deixa a desejar. Mas que não se cometam julgamentos
precipitados: vale a pena, sim, ver o filme! Vale pelo argumento, pelos protagonistas, pelas locações. Pelo fato de ser um filme
que consegue libertar-se das imagens oficiais da cidade, insurgindo-se contra
elas, apresentando uma paisagem familiar a quem conhece a capital além do lugar
comum, além do enquadramento veiculado pelos noticiários, além dos limites do
Plano Piloto, onde só podem entrar os eleitos, portadores do passaporte
especial...
BRANCO SAI, PRETO FICA
DIREÇÃO Adirley Queirós
ELENCO Marquim do Tropa, Dilmar Durães e Gleide Firmino
PRODUÇÃO Brasil, 2014, 12 anos
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