domingo, 11 de novembro de 2018

Nota de passagem: em memória de Seu Manoelzinho



p/ Seu Manoel Loreno, in memoriam 



Desde então, passaram-se já pouco mais de 10 anos. Eu soube de seu trabalho por meio das mídias. Algum noticiário de entretenimento veiculou uma entrevista com ele, falando sobre seus filmes. Era um homem de estatura pequena, olhos miúdos e atentos, uma expressão alegre, entusiasmado com seus projetos. Tinha carisma, e era garantia de audiência.

Assim, quando esbocei meu projeto de pesquisa para pós-doutoramento, incluí o trabalho do Seu Manoel Loreno entre aqueles que eu gostaria de conhecer, para pensar outras vias de construção narrativa, fora dos circuitos dominantes, fossem os comerciais, fossem os mais intelectualizados ou artísticos. Seu trabalho figurou, no mapa, ao lado do trabalho do Seu José Zagati, o catador de sucatas amante do cinema, em Taboão da Serra, do Seu Simião Martiniano, o camelô do cinema de Jaboatão dos Guararapes e Recife, e de Afonso Brazza, o Rambo do cerrado, do Gama, no Distrito Federal, este já falecido no início dos anos 2000.

O primeiro contato com Seu Manoel Loreno foi por telefone. Já não me lembro ao certo como eu o fiz, buscando informações na Prefeitura de Mantenópolis, e outras informações conseguidas na internet. Encomendei-lhes alguns filmes, que recebi pelo correio. Assim, quando fosse ao seu encontro, já conheceria um pouco de sua produção. Em agosto de 2009, seguimos, eu e o Prof. Bamberg, de avião até Vitória, no Espírito Santo. E de lá, continuamos, de carro, até Mantenópolis, no extremo oeste do Estado.

Foi nosso primeiro contato com ele, e com a comunidade daquela cidade pequenina, acolhedora, cenário de seus filmes, fonte de inspiração para suas histórias. Durante os dias em que estivemos ali, conhecemos alguns sítios onde foram gravadas cenas de seu último filme, O homem sem lei, de 2006. Conhecemos, também, o documentário O Sonho de Loreno, de Alana Rosa Batista Almondes, que foi responsável por dar a conhecer o trabalho de Seu Manoel aos meios de comunicação.

Os professores Aluísio e Clébio, à época ligados à Secretaria de Cultura do município, foram incansáveis no sentido de criar as condições para que tivéssemos acesso às informações, conhecêssemos as pessoas, e, sobretudo, pudéssemos acompanhar o Seu Manoel, ouvindo suas histórias, aprendendo com ele.

Dois anos depois, nós retornamos a Mantenópolis. Na ocasião, queríamos acompanhar os trabalhos de gravação de seu novo filme. O título era alguma coisa como: Um Manoelzinho é bom, dois é demais. E contava a história de um Manoelzinho que se via às voltas com os problemas causados por um sósia, ou um clone seu, que era mau caráter. Esse filme nunca foi finalizado. O professor Clébio Saldanha já estava vinculado ao Museu Histórico de Mantenópolis, e continuava buscando alternativas para assegurar suporte ao Seu Manoelzinho, para lhe assegurar condições de continuar produzindo, e mostrando seus filmes à comunidade.

Somos muito gratos ao professor Clébio por ter, no decurso do tempo, nos enviado informações, vídeos, notícias sobre os caminhos de Seu Manoel. Foi ele, também, que nos enviou, ontem, a notícia do falecimento do nosso cineasta, este fazedor de filmes cuja produção marca um tempo, uma visão de mundo, um modo de estar no mundo cuja potência é transformadora.

Há pesquisadores e profissionais da mídia que classificaram seu trabalho como cinema de borda. Afora as discussões teóricas a respeito, peço licença para discordar. O trabalho de Seu Manoel Loreno jamais foi de borda. Ao contrário: ocupou o centro da produção cultural de Mantenópolis durante quantos anos. Foi capaz de mobilizar sua comunidade, de levar filmes a territórios desprezados pelas políticas públicas, pelos circuitos comerciais e pelos projetos intelectualizados do cinema. O trabalho de Seu Manoelzinho teve a potência que a maior parte dos trabalhos veiculados em festivais de cinema não têm, embora tragam a chancela dos supostamente cinemas de centro porquanto chancelados por autoridades da área: críticos de cinema e de arte, produtores, professores, etc. Seu Manoelzinho passou ao largo disso tudo, para contar suas histórias, para fomentar processos criativos junto à sua gente, a despeito da precariedade de equipamentos e das condições de realização. Mais que isso: ele fez da precariedade uma aliada, o ponto forte dos modos de operacionalização de seu trabalho.

Que possamos aprender mais com pessoas como Seu Manoel Loreno. Que trabalhos como o dele se multipliquem, em ramificações cada vez mais potentes.

Sou grata pelo privilégio de tê-lo conhecido, e à sua família, e aos seus amigos.

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Bordados com fios de afeto











A Oficina dos Fios é uma disciplina de Núcleo Livre que nasceu de partilhas e experiências coletivas envolvendo processos de criação no encontro entre pessoas. É na possibilidade do encontro que reside a poesia. A partir daí os fios conduzem a experiência, nos bordados, na tecelagem, no tricô, no crochê, pelos caminhos, pelos desvãos...

No decurso desses 10 anos, a cada oferta (sem muita regularidade...), ela toma feições distintas, propicia partilhas novas, celebrações sempre diferenciadas.

Nesta última quarta-feira, dia 7 de novembro, tivemos o privilégio de receber a Prof.ª Julia Mariano com um grupo de estudantes do curso de Cinema e Audiovisual da UEG, que trouxeram suas pesquisas sobre artistas cujos trabalhos envolvem fotografias, bordados e outras manualidades. E propuseram uma oficina sobre fotografias bordadas.

Foi uma tarde tão especial, inesquecível, com transbordamentos de sensibilidade, afetos, encantamentos. Um presente.

Que nos seja dada a possibilidade de exercitar encontros e compreender esses momentos como exercícios de poesia que independem dos produtos finais. Que a ética e a estética desses encontros orientem nossos caminhos, conduzidos por fios que bordam e rebordam sensibilidade.

Obrigada, Prof.ª Julia, Hal, Karen, Halanda e Leo!