Comprei o bilhete para um voo direto de Goiânia a
Salvador. Dois dias antes, fui informada, pela Gol, que meu voo tinha sido
alterado, e agora eu faria uma conexão em Brasília, a partir de onde eu
seguiria num avião da Webjet. E perguntaram-me se eu concordava. Havia alguma
opção? Não. Era pegar, ou largar. Se largasse, poderia até receber meu dinheiro
de volta, sem correção, sem multa – para eles –, nada. Suspirei fundo. Peguei.
No dia marcado, segui para Brasília, onde faria a
conexão. Lá, o embarque, pela Webjet, foi pontual. Mas, o procedimento foi uma
peripécia: o portão de embarque foi feito num “puxadinho” improvisado além da
área de embarque internacional, por onde circulavam fluxos intermináveis e
densos de pessoas em trânsito, estressadas, nervosas, maltratadas,
mal-educadas.
Quando chamados, os passageiros do meu voo foram
acomodados num ônibus, e seguimos para o extremo oposto da área do aeroporto,
na região onde ficam acomodadas as encomendas aéreas. Embarcados, acomodei-me
numa poltrona K, entre a L, na janela, e a J, no corredor. À minha esquerda, um
senhor de porte médio, apoiou a cabeça na janela, e fechou os olhos. Dormia?
Talvez. Talvez tentasse – como eu fiz mais tarde – não olhar para não ver, e
assim, sentir menos, e também se ressentir menos, da viagem. À minha esquerda,
um senhor de mais idade, muito mais alto, com as pernas prensadas entre sua
poltrona e a da frente. Ele pendeu a cabeça para a frente, e ficou ali, com os
olhos fechados, também. Observei que o espaço entre as cadeiras havia diminuído
ainda mais – como se fosse possível! –, as cadeiras estão mais delgadas, e o
encosto já não reclina.
Também eu cruzei os braços, recostei mal a cabeça no
encosto, e fechei os olhos tentando abstrair o contexto. Percebi que seria
difícil. Meu corpo doía, a poltrona era mais desconfortável do que o normal, havia
barulho em excesso...
À entrada na aeronave, os comissários tinham entregado um
cardápio, para aqueles que quisessem pedir algo para comer ou beber. Assim, tão
logo os procedimentos de segurança foram cumpridos, o avião decolou, e o voo
estabilizou, as pessoas começaram a chamar os comissários, agora deslocados à
função de caixa e garçom, para fazer seus pedidos.
Eu sentia uma dormência pelo corpo, cochilava um pouco, e
entreabia os olhos. Então avistava o comissário-caixa-garçom, com a máquina de
operar cartões de débito nas mãos, atendendo alguém. Mais um cochilo, mais uma
olhada de relance, e lá estava ele, solícito, com a famigerada máquina de
operar cartões de débito, algumas notas de dinheiro entre os dedos, anotando
pedidos para mais algum passageiro. Meu corpo doía. Movia-me um pouco na
poltrona, para melhorar a circulação. E tentava me desligar, fechando os olhos,
como os meus companheiros, à direita e à esquerda. Mais um pouco, e novamente a
visão do comissário cumprindo a função de garçom, com um sorriso de matéria
plástica nos lábios.
De tempos em tempos, alguém, ao microfone, com a voz educada
em escolas de telemarketing, e um sotaque nordestino domesticado aos moldes
cariocas, anunciava que a Webjet era a empresa aérea mais pontual do país.
Chegamos a Salvador – o que, por alguns momentos,
pareceu-me, não mais aconteceria. Recolhi minha bagagem na esteira. Dois
rapazes ao meu lado comentavam, indignados: “Nem um copo d’água, bicho? De que adianta ser a mais pontual, se não
servem nem um copo d’água! Vendem tudo!” Àquelas alturas, achei graça. Nada
mais tinha a fazer, além de rir-me ante a constatação de que se acabara o
pesadelo. No mais, avançada a noite, era providenciar minha saída dali o mais
rápido possível.
Sim: nem um copo d’água, meu irmão!
E eu, com a sensação física de estar despertando de um
pesadelo...
e tem gente que ainda tem medo do inferno.... hehehehe
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