quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Sobre ubiquidades espaço-temporais, e o imperativo de viajar… parte I

Parte I


Recebi uma mensagem pelo correio eletrônico. Ela iniciava afirmando: “Ontem foi rejeitado projeto de lei...”, e convocava todos da lista a tomarem uma posição a respeito, dada a importância do assunto. O texto era indignado, e pretendia a solidariedade dos destinatários.

Eu me perguntei: ontem de qual dia? Verifiquei na postagem, e só encontrei a data do envio da mensagem. Copiei o título e joguei num site de busca, para verificar se havia alguma repercussão a respeito. Encontrei chamadas iguais à da mensagem datadas de 2010, 2011, 2012, e algumas de 2013. Estas últimas veiculadas há coisa de um mês.

Esse não foi um evento isolado: todos os dias, leio notas, chamadas, cochichos nas redes sociais e outros ambientes, que fazem referências a temporalidades não identificadas, evidenciando uma transformação, em curso, nas percepções das as relações entre presente-passado-futuro:

Agora é fato! A partir de amanhã serão feitas cobranças... por isso você deve tomar a seguinte providência: ...

Hoje aconteceu uma tragédia, que não pode passar em branco. É preciso que nos manifestemos em favor...

Ontem esta pessoa desapareceu! Precisamos ajudar a família urgentemente! Amanhã isso poderá ter acontecido a alguém da nossa própria família...

Tempo e espaço reduzem-se ao aqui-agora, apagando projeções e reconstituições, bem como referências de localização. Aqui, agora, numa noção ubíqua de tempo-espaço que vai diluindo, em sequência, as percepções. Ontem é ontem de todos os hojes, que antecedem todos os amanhãs, sempre agora, aqui. Nada além, antes ou depois.

Talvez por isso mesmo viajar tenha se tornado um imperativo do nosso tempo... "Para onde você vai viajar nestas férias?"... "Não poderei participar, pois estarei viajando"... "Mal desfiz as malas, para refazê-las"... "Ainda não viajou?!"... "Acabei de chegar de viagem, trouxe um presentinho para você"...

Alimentaríamos assim a ilusão de libertação desse aprisionamento... Talvez seja difícil, mesmo, perceber, ou admitir que viajamos, e viajamos tanto, sempre aqui, sempre agora... Não importa para onde partamos, ou de onde cheguemos... Como pássaros aprisionados em grandes jaulas, a voar exaustivamente para acreditar na liberdade...





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