quarta-feira, 24 de julho de 2013

nuvens...


Embarquei, e acomodei-me numa poltrona no corredor. Ao meu lado, duas senhorinhas cujas feições não pareciam ser de pessoas que habitualmente viajem de avião. A do meio, mais forte e tagarela, logo me contou que estava aflita para chegar em casa. A outra, sentada à janela, era mirradinha, caladinha, os olhos fixos no chão. 

Comecei a ler o trabalho de um aluno, e a senhora ficou olhando meus gestos. Percebi o brilho nos seus olhos. Sorri para ela, que me confessou: Esse sempre foi meu maior sonho! E apontou para o texto, onde eu fazia anotações: Saber ler... meu pai não conseguiu me mandar para a escola... eu sou analfabeta! Não sei ler nadinha! O moço mandou ler este cartão aqui, se precisar, eu não consegui ler nada! Referia-se às instruções do Comissário de bordo, para os casos de emergência. Disse-lhe que ficasse tranquila, pois não aconteceria nada; mas, se ela precisasse de alguma coisa, eu a ajudaria.

Fiz uma pausa para ouvi-la, quando acrescentou ser aquela sua primeira viagem de avião. Passear é bom, mas eu quero é voltar prá casa... E continuou: Já tenho tanto neto, e é a primeira vez que ando de avião?!!!

Retomei minha leitura, enquanto ela observava tudo à volta. Findava a tarde, e o sol se pondo dourava o céu. Ela olhou longamente pela janela, e me perguntou: Isso aí fora, o que é? Não compreendi ao que ela se referia. Então ela acenou com a mão, fazendo uma ondulação com o gesto. São as nuvens... Ante minha resposta, foi ela que me olhou sem compreender. Nuvens? Percebi que tinha a oportunidade de vivenciar um momento especial, de espanto e sensibilidade, de experimentação do novo: Quando estamos no chão, em casa, a gente olha para cima, e vê as nuvens, não é? Pois então, agora estamos dentro do avião, e o avião voa muito alto, e passa para cima das nuvens. Por isso a gente vê as nuvens olhando para baixo...

Ela continuou a olhar pela janela, e chamou a atenção de sua companheira, que continuava mirando o chão da aeronave: Olhe, as nuvens... Depois de uma breve pausa, completou: Olha como elas parecem fumaça...

Não consegui retomar a leitura, embevecida com o que acontecia em seus olhos. Logo iniciaram-se os procedimentos de pouso.



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