Na primeira banca, perguntei: “O senhor tem cancorosa?”. Ele me olhou, e disse, com firmeza, que não. Apontou, ainda, que eu procurasse na banca ao lado, talvez ali pudesse encontrar. Fiz a mesma pergunta ao vizinho, que também respondeu negativamente, sem hesitação. Questionado sobre onde eu poderia encontrar, apontou a banca da frente, observando: “Ela é que costuma ter essas coisas estranhas”. Compreendi, então, que ele não sabia o que era cancorosa. Achei graça, e perguntei pelo outro nome: espinheira santa. Ah, isso ele tinha! Trouxe-me um pequeno saco de plástico, com as folhas bem esmagadas. Observei que, na verdade, eu queria as folhas inteiras. Ele me explicou que as folhas inteiras ocupam muito espaço, e precisam ser embaladas em sacos maiores. Os sacos estão caros. -“A gente espatifa ela bem espatifadinha, aí elas cabe do saco menor. Fica mais barato”. Tinha espatifado tanto, que parte dela virou farinha... Insisti na preferência às folhas inteiras, e ele recomendou, novamente, a banca da D. Eulália. A velhinha é graciosa, tem uma banca cheia de folhas medicinais, artesanato, cerâmicas, e outras quinquilharias. É famosa: já apareceu em vários programas de televisão, está acostumada a ser entrevistada. Artista, ela. - “A senhora tem espinheira santa?”; - “Tenho sim, minha filha!”; -“E a que a senhora tem, é inteira ou espatifada?” (eu aprendo rápido!). Era inteira. –“Cuidado, minha filha, para não machucar sua mão com os espinhos!”. De quebra, troquei uns dedos de boa e divertida prosa, e comprei mais alguns pacotinhos de marcela amarelinha, cheirosa...
Na saída, resolvi procurar por uma caneca de alumínio de boca estreita, alta, com tampa, para fazer café. Queria presentear um casal de amigos. Na parte superior do Mercado, na primeira loja, mostrei, com as mãos, as dimensões da caneca. A senhora que me atendeu repetiu meu gesto, observando o que dispunha nas prateleiras. Não encontrou: as canecas que tinham a altura solicitada eram bem mais largas; se tinham o mesmo diâmetro, eram bem mais baixas. Não me serviam. Então sua curiosidade foi despertada. –“O que você vai fazer com ela? Vai ferver leite?” Na verdade eu não queria entrar em detalhes sobre o uso que seria feito. Bastava a informação: tem ou não. Além disso, não tinha a menor intenção de comprar uma com outras dimensões. Ela decidiu investigar o destino que eu daria à tal caneca. Tentei ser breve: - “É para fazer café”. Sabia que não deveria ter dado início às explicações. Àquelas alturas, tinha me metido numa encrenca, pois ela teria vários contra-argumentos, na tentativa de me vender alguma das que ela tinha. –“Fazer café? Mas esta dá!...”, mostrando-me outra. Expliquei que não servia. –“Mas o que você vai fazer com o café?" Eu precisava para torrar o café. –“Mas você torra o grão, ou o pó?”. Ri-me: -“Torro ligeiramente o pó, com algumas misturas...”; -“Ah, então você mistura o pó de café com outras coisas...”. Expliquei que, na verdade, era o tempero do café... Neste ponto da conversa, eu já estava na loja seguinte, e já constatara que ali tampouco havia a tal da caneca. A senhora, que me seguira até ali, acenou, simpática, para mim, de volta à sua loja: -“Você precisa me ensinar essa receita, viu?”. Encontrei a caneca na última porta, quase na boca da rampa que dá acesso à saída. Era a única na prateleira.
Esse café está ficando famoso. hein? Tb quero a receita.
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