A todas as crianças subtraídas de suas famílias originais.
Que algum dia possam encontrar o caminho de volta,
com afeto, como aconteceu com Pedrinho.
Seguíamos, eu
e minha irmã, pela feira, divertindo-nos entre o movimento, cheiros, cores,
texturas, tecidos, roupas... A certa altura, ela avançou o passo, eu me distraí
entre alguns vestidos, e o rapaz, dono da banca, aproximou-se para conversar. Perguntou-me
se eu era irmã da mãe do Pedrinho. De pronto, não entendi. Ele refez a pergunta
que, de fato, era uma afirmação: ela é a
mãe do Pedrinho, e a senhora é irmã dela! Sorri explicando que ela não era
a mãe do Pedrinho, nem eu sua tia. Então soube que, naquele corredor, a
conversa já tinha se espalhado: a mãe do
Pedrinho está aí!
Contei o
ocorrido para minha irmã, e constatamos que, de fato, ela tinha traços físicos comuns
à Dora, a incansável mãe do menino roubado. Eu nem lembrava mais o nome dela, mas minha irmã referiu-se com
naturalidade ao assunto. E acrescentou: O
Pedrinho já está casado, tem um filho, fez Direito, já é homem feito.
Tanto o rapaz
da banca, quanto nós duas, conversávamos como se fosse sobre alguém da família, ou muito próximo. E confesso que fiquei impressionada com o
modo como a história do menino recém-nascido roubado da mãe ficou marcada no
imaginário coletivo. Fala-se do Pedrinho com afeto e familiaridade. A mera
referência ao nome Pedrinho evoca, na memória comum, a história partilhada por
todos, na tristeza, na torcida, na alegria do retorno, na expectativa por
justiça.
Parece, mesmo, que
essa história foi rebordada, com pontos que se ligam às demais histórias
pessoais, cidadãs, em Brasília.
Por acaso, minha mãe estava internada no
Hospital, em 1986, quando uma mulher entrou em seu quarto, perguntando pelo
bebê. Minha mãe riu, e disse que ela não tinha tido criança, que estava ali
para tratar da vesícula. Conversaram um pouco, e a mulher saiu. Na sequência,
entrou no quarto onde Dora estava, cuidando do Pedrinho recém parido. Ela pegou
o menino, sob um pretexto qualquer, e foi-se com ele. A partir dali, iniciou-se
uma saga de dor, tristeza e desespero àqueles pais, que nunca desistiram de
procurar pelo filho. E contaram, todo o tempo, com a solidariedade da
população.
Em 2002, o
caso ficou conhecido nacionalmente, quando a mulher teve sua identidade
revelada, Vilma, e toda a história foi esclarecida. Pedrinho já era rapaz, e
atendia pelo nome de Osvaldo. Uma filha do marido de Vilma fez a denúncia, um
exame de DNA comprovou a identidade do menino. Vilma foi condenada por esse
sequestro, e também por falsidade ideológica em relação a outra filha,
registrada em seu nome, mas que não é filha biológica.
Mas Vilma cumpriu
a maior parte da pena em regime semiaberto, e também domiciliar.
A volta para
a casa dos pais biológicos foi cercada de cuidados e afetos, para que não se perdesse
mais do que o já perdido, ao longo de quase duas décadas. Família completa,
novamente, a vida de cada um retomou o curso de sua normalidade. Mas no
imaginário de quantos tenham acompanhado a história, as personagens continuam vívidas.
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