Depois que os dois filhos ficaram mais taludinhos, e já estão frequentando regularmente a escola, ela e o marido voltaram a estudar também. Trabalham durante o dia, e à noite seguem para suas aulas na educação de jovens e adultos. Duro exercício, esse, de reativar a memória para a escrita, para as operações matemáticas, o registro de datas, nomes, conceitos, depois de tanto tempo ocupados com outros afazeres. Canetas e cadernos pesam mais que o cabo da vassoura, ou a máquina de preparar o cimento na construção civil. Mas é com alegria que cumprem o novo desafio. O esforço tem a medida da fome de conquistar outros espaços, de saber mais sobre o mundo. Fome que também aperta o estômago findo o dia, e é saciada com o lanche servido todas as noites, em meio à jornada de estudos. Há décadas, desde as minhas primeiras incursões nas escolas, o arroz com carne seca, o macarrão com sardinha, a canjica, a sopa, o achocolatado com biscoitos vêem em pratos e canecas de plástico cor azul escura, acompanhados de colheres do mesmo material. Sinto, vivos na memória, o cheiro e a textura das vasilhas, e também dos cardápios oferecidos a estudantes e professores nas escolas públicas.
Nesta última semana ouvi de um professor que a escola, nos aspectos do espaço físico e suas dinâmicas de funcionamento, não teria mudado no decorrer das décadas. Retruquei, defendendo que, se há aqueles pontos nos quais ela não mudou, em outros ela não se parece em nada com o que fora há algum tempo. Talvez eu quisesse me agarrar a alguma esperança de transformação. Talvez eu nem fizesse essa afirmação com otimismo, pensando mesmo nas coisas que pioraram nessas três décadas em que venho interagindo com as instituições escolares. O fato é que, desde os anos 80, ao que me lembre, o lanche tem o mesmo cardápio, e é servido nas mesmas vasilhas de plástico azul escuro. Seja para crianças, seja para adultos...
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