terça-feira, 12 de abril de 2016

Mimi é avó


Quando a família mudou-se do apartamento, deixou para trás, em condição de orfandade, a pequena Mimi. Perdida, abandonada, a gatinha andou se escondendo pelos escuros, tentando conseguir alimento, e levando algumas surras que fizeram dela ainda mais arisca. Suja, maltratada, o brilho do pelo foi ficando desbotado. A mistura de sua natureza vira-lata com informações genéticas da raça siamesa perdeu a força e a beleza.

Os porteiros dos dois prédios contíguos, por onde ela circulava às escondidas, começaram a deixar-lhe algum leite e ração, sem forçá-la a aproximações indesejadas. Desconfiada, ela achegou-se, em busca do alimento. Mantendo o jeito arredio, adotou os novos amigos. Gata de rua, mas nem tanto. Logo emprenhou. Seus guardiões ficaram atentos à hora de ela dar cria. Mas ela se sumiu com os filhotes. O esconderijo em cima de outro prédio demorou algum tempo para ser revelado. Na segunda ninhada, todos já sabiam para onde ela iria, e puderam ajudá-la de modo mais eficiente. E também decidiram castrá-la.

Seus filhotes tiveram destinos diversos. Uns foram adotados, outros ninguém sabe, outros se criaram ali, pelos mesmos territórios da mãe.

Castrada, o pelo da Mimi ganhou mais brilho, as cores ficaram mais vivas. O azul dos olhos parece transbordar. E ela ficou mais amigueira. Achega-se às pernas de alguns moradores, oferece a barriga ao carinho de outros poucos... Está bem, nem tão poucos assim... Entre uma e outra demonstração de dengos, um de seus guardiões revelou que ela já é avó. Sim: uma filha teve a primeira ninhada debaixo de um carro antigo, estacionado em frente ao prédio. Uma senhora, moradora do outro prédio, está dando atenções à nova família. Os porteiros dos prédios também estão no monitoramento. Já aparecem os candidatos para adoção dos seus netos. Por baixo do tal carro, avistei o vulto da mãe recém parida, às voltas com a ninhada.

Além de pop, Mimi é, já, uma respeitável avó felina. O porteiro apruma-se, orgulhoso, como se fora o próprio tio avô... Ela o observa, com os olhos semicerrados, e solta um miado fino, curto. Quase um sussurro. Soa como uma declaração de amor.






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