quinta-feira, 28 de março de 2013

Declaração da pós-modernidade anacrônica



1. Declaro a morte do autor formal. Ao final, assino o texto, publico e cobro o pagamento dos direitos autorais;
2. Declaro a morte do artista autoral. E inscrevo meu último trabalho no próximo salão de artes, exijo que meu nome conste do catálogo, e registro essa referência em meu portfólio cada vez mais numeroso em itens e títulos;
3. Declaro a dissolução do binômio erudito/popular (mas não a extinção da separação entre ricos e pobres...). E absorvo em minha obra elementos da produção de atores inominados da cultura, e apresento os resultados entre meus pares, ganhando reconhecimento pela ousadia e pelo sentido de ruptura de que o meu trabalho esteja impregnado;
4. Declaro a quebra das estruturas hierárquicas que cristalizam as relações de poder. Depois, tranco a chaves a porta da sala de cristal onde me abrigo à sombra do poder, evocando para mim o papel de porta-voz da revolução possível;
5. Declaro o desfazimento das fronteiras. E, da janela do avião, olho a paisagem sem qualquer envolvimento. E, nos percursos entre aeroportos e hotéis, não arrisco ultrapassar as outras fronteiras que preservam meu conforto em condições privilegiadas de instalação;
6. Declaro instaurada a pós-modernidade desterritorializada, portadora de múltiplas identidades, marcada pelos fluxos em escala planetária de pessoas, imagens, informações, capitais, desejos. Depois de redirecionar meus saldos bancários para melhores investimentos ao momento, recolho-me aos jardins de inverno do meu palácio, onde posso brindar com meus convivas, enquanto a corveia anônima prepara o lauto banquete do qual não tomará parte ativa alguma.
Mas, por outra, ... et pur si muove!... Ponto.
Rio de Janeiro, 24 de junho de 2010
Alice Fátima Martins


Este texto integra meu livro Catadores de sucata da indústria cultural, que integra a coleção FUNAPE/UFG, a ser lançado no dia 11 de abril de 2013, às 19h, no Hall da Biblioteca do Campus I. Espero por vocês lá!


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