segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Um ingresso por uma casa para Néia



Sempre achei muito caros os ingressos cobrados pelo Cirque Du Soleil. Mas nunca tive dúvidas quanto ao potencial de encantamento dos seus espetáculos, quantos deles marcando de modo indelével nossos imaginários. Tudo fruto de trabalho primoroso e exaustivo desenvolvido a longo prazo, envolvendo doses equilibradas de técnica, tecnologia e paixão. Por isso, naquele ano decidi que iria ao Cirque, e essa seria a celebração do meu aniversário.

Foi por aqueles dias, também, que encontrei a Néia cheia de angústia. Estava morando com os dois filhos pequenos e o marido numa casa alugada, localizada num bairro distante, sem água, nem segurança. Acabava passando os dias com a mãe, e temia que lhe roubassem suas poucas coisas, enquanto estava ausente. Precisavam decidir se valia a pena cavar um poço, ou investir o dinheiro – de que não dispunham – para arrumar um barraco nos fundos da casa de sua mãe, dando condições mínimas de habitação. O que falta? Portas e janelas, e fiação para puxar a luz. Assim, já seria possível a família ocupar o espaço da casa. Tudo o mais poderia ser ajeitado depois aos poucos. De quanto precisariam para essa primeira etapa? Pouco mais do que o valor de um ingresso para o espetáculo do Cirque Du Soleil...

Naquele ano, pedi ao meu marido, como presente de aniversário, que se juntasse a mim para participar do trabalho que asseguraria condições à nova morada da Néia e sua família. Não fomos ao Cirque. O valor dos dois ingressos foram convertidos em material de construção. Depois confessamos, um ao outro, a alegria em estado puro que nos assaltou, tomada a decisão.

Um ano e meio depois, as paredes já estão todas rebocadas e pintadas, o piso com cerâmica, água nas pias, no tanque, no sanitário. No mês vindouro, começarão a construir mais um cômodo, para desmembrar a área da sala de estar da cozinha.

O Cirque está em mais uma tournê pelo Brasil.


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