p/ Néia
Já quase à hora de ir embora, ela lembrou que tinha trazido “uma
coisa” para mim. E mostrou um copinho descartável de café embrulhado num pedaço
de plástico branco, meio rasgado. Segurava com cuidado aquela fragilidade. Tinha
vindo de ônibus, transportando aquilo. Eu olhei, sem entender do que se
tratava. Ela começou a explicar que o marido tinha limpado umas lâmpadas, e ela
se lembrou de mim. Aí pensou que eu poderia fotografar. Enquanto ia falando, tirou
o plástico do copinho, e derramou o conteúdo sobre uma folha branca. Os insetos
secos se acomodaram ali, uns por cima dos outros. Tinham morrido nos embates
com as lâmpadas de sua casa. Retirados de lá por seu marido, ela os recolheu. Sob
sua tutela, nenhum se quebrara, ou fora danificado. Seus olhos brilharam, me
olhando, à espera da minha reação. Eu fiquei ali, com a respiração em suspenso.
Não tenho dúvidas: ela bebeu água da mesma fonte que Manuel de Barros. Então ela
foi me mostrando cada um, dos maiores aos mais pequeninos, quase indecifráveis.
Olha a cor deste! Olha a asinha deste outro! Ela foi olhando cada um como se
visse pelos meus olhos. Ela pensou que eu poderia fotografar cada um, com aquela câmera que fotografa as
coisas pequenas. As insignificâncias... Mas a poesia estava era ali, no seu
olhar, no seu gesto, no seu encantamento. Depois ela se riu: Olha só, o presente que eu
trago para você!
Eu não poderia estar mais grata.
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