Quando afirmo:
“cortei minha mão”, algumas perguntas
me assaltam: se a mão é minha, e não sou eu, quem é essa entidade à qual a mão
pertence? Mais que isso, quem é essa outra entidade que provoca o corte na mão
que, não sendo eu, pertence a outrem? De que lugar do corpo, ou melhor, de que
lugar, que voz pronuncia a relação de posse com o corpo? Meu pé, minha perna,
minha voz, meus olhos, meu coração...
Se tenho
transplantado o pé, não deixo de ser eu, e o novo pé passa a integrar a lista
de pertencimentos dessa entidade que continua a pronunciar: meu pé. Pergunto,
então, qual o limite de transplantes é possível de se realizar para que essa
entidade se reconheça como eu? Posso transplantar os pés, as pernas, os braços,
os rins, o útero, o fígado, o coração, os ossos, a pele... Quanto da pele? Em
que partes do corpo? Poderia ter o rosto transplantado, e o reconheceria como
meu? Ou como eu?
De onde é
pronunciado esse pertencimento? Do cérebro? Provavelmente não, pois também a ele
me refiro como sendo meu: meu cérebro se confunde, e não consegue responder essa questão.
Meu, de quem? Que metafísica é essa que descola o corpo daquilo que sou,
colocando-o no lugar daquilo que me pertence?
Nenhum comentário:
Postar um comentário