Meu tio querido nos ligou, antes de acabar o ano. É sempre
uma alegria falar com ele, e ouvir-lhe as palavras de afeto. Queixei-me que
sentia saudades. Para ele, a solução era simples: por que eu não ia até lá, para vê-lo? Você não
tem férias? Mais ou menos, lhe respondi, tentando explicar o imbróglio do calendário
da universidade... Pensei na complicação de explicar sobre as ocupações, preferi falar que tinha havido greve, que eu teria de repor aulas em janeiro, assim eu teria
férias, mas não seriam férias como deveriam ser... e já ia achando aquela conversa imprópria para aquele
momento, para aquela alegria, então fui encerrando as explicações. Ele ouviu
tudo e, quando eu calei, ele me perguntou: Você sabe o que é mais ou menos?
Pressenti que me aguardava, à frente, alguma piada, e decidi me entregar a ela.
Não, tio, o que é? Você não sabe o que é mais ou menos? A repetição da pergunta
já tinha uma pitada de deboche, uma provocação. Ele não deixaria por menos: como eu, professora
universitária, não sabia o que era mais ou menos? Insisti que não sabia. O que
é mais ou menos, tio? Ele fez uma pausa performática, criando algum suspense, dominando a cena. E
disse, inicialmente muito sério: Mais ou menos é... cu de petiço (1). E desatou a
rir. E eu também. Sempre acontece assim: ele começa a contar uma piada,
e então começa a rir, e ri tanto, que muitas vezes nem consegue contar a piada
direito. Mas seu riso é contagiante, e a gente ri junto, mesmo sem entender a
piada. Não foi esse o caso. Eu entendi o cu de petiço. E por isso mesmo ria
mais ainda, com ele. Mas ele avançou e, numa pausa entre-risos, decidiu explicar: é que o
cu de petiço não é nem muito alto nem muito baixo, é mais ou menos. E caiu na
gargalhada de novo. A estas alturas, eu já ria solto dele e da explicação dada. Então ele
me perguntou: Você está em Brasília? Como está o presidente? Como
é mesmo o nome dele? Esqueci... Ah, aquele cu de petiço! E desatou a rir de novo. Depois de mais
algumas tentativas de emplacar alguns outros assuntos, voltando sempre às
gargalhadas, começamos a nos despedir. Então ele desejou um feliz 2017. Que o
ano novo não seja... um cu de petiço!
Ele se ria tanto, que quase não conseguiu desligar o
telefone. Nem eu.
Que 2017 não seja um cu de petiço. E se for, que nós
possamos debochar e rir, rir tanto a ponto de ficarmos frouxos de riso.
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