terça-feira, 1 de novembro de 2016

A menina, o balão com gás hélio e o sentimento de perda

p/ Maria e Thais

A menina saiu do espetáculo de teatro exultante. Levava consigo, preso a um fio quase invisível, um balão cheio com gás hélio. Esses balões exercem um encantamento à experiência de crianças e adultos. Talvez por não levarem em consideração as leis da gravidade, e se desvencilharem dessas amarras invisíveis que nos matêm aprisionados ao chão. Talvez por serem capazes de partir. Talvez por nos lembrarem da leveza.

A menina saiu do espetáculo levando um pouco de leveza presa às suas mãos por um fino e delicado fio. Como esses fios que quase não percebemos, mas estabelecem vínculos de afeto.

No pátio, enquanto as últimas conversas preparavam as despedidas, a menina observava o movimento das pessoas. O balão flutuava sobre sua cabeça. Então ela levantou os olhos, e o viu distanciando-se, acima de todos. Por alguns instantes, não compreendeu o que se passava. Em seguida não quis acreditar. Mas olhou as suas pequenas mãos, de onde se desprendera o delicado fio, e então caiu em pranto, abraçada ao ventre da mãe.

O balão foi subindo, leve e lentamente, entre a noite sem estrelas da cidade movimentada. Ela não quis mais olhar.

A mãe amorosa lhe disse que poderiam comprar outro. Naquele momento, nada a consolaria. O balão comprado seria outro. Aquele que se lhe escapara portava mais que leveza: estava impregnado das cenas do espetáculo ao qual assistira. Partindo, levara as histórias para brilhar no firmamento. Não haveria outro.

Talvez, além de portar histórias e leveza, o papel do balão tivesse sido propiciar a aprendizagem da perda, cuja dor poderia ser amenizada pelas histórias, pela leveza, mas principalmente pelo tempo...

Olhei a noite, tentando adivinhar o destino do balão. E encontrei-me criança novamente, olhando na direção da estrada, tentando adivinhar como seriam os lugares para onde iam aqueles que partiam. Imaginar esses lugares era também um modo de amenizar a dor da perda, a solidão de quem fica.

Não demorou para que chegasse a minha vez de partir. Pelo caminho, multiplicaram-se as partidas e as perdas. Nem sempre portadoras de leveza...





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