segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Ratazanas

Para Manoela

Algumas vezes retornei sozinha à minha casa de infância, e me reencontrei com seus espaços repletos de memórias... ou ratos...

Numa dessas vezes, estava ocorrendo uma invasão de ratos do campo na casa fechada. Os caseiros, que moravam ao lado, mal davam conta de controlar a entrada das ratazanas em sua própria residência.

Informada do ocorrido, mas determinada em retornar, incluí na bagagem minha velha rede de algodão, pregos grandes, ganchos de rede. Desembarquei do ônibus no final da manhã, com tempo o suficiente para escolher o melhor lugar de instalar minha dormida. A rede ficou suspensa ao alto, de modo me alimentou a impressão de estar a salvo, quando a noite chegasse e os ratos começassem a invadir todos os aposentos.

Armei, também, algumas ratoeiras em lugares estratégicos.

Quando o sol se pôs, em direção ao Paraguai, vi os pequenos animais saltando dos galhos de goiabeiras próximas para o telhado, e dali passando ao forro, e do forro ao restante da casa.

A esposa do caseiro me explicou que os bichos comiam a cabeça das mariposas. Naqueles dias, elas estavam desovando na plantação de soja. Logo iniciaria o tempo das lagartas. Por isso, principalmente à noite, o chão ficava coberto pelas mariposas.

Não tardou para eu me recolher à rede. Do meu posto-porto de segurança, tentava compreender o que se passava no escuro absoluto em que eu mergulhara. Ouvia os animais caminharem pela casa, do forro ao chão, e pequenos estalos indicavam que, provavelmente, eles estivessem devorando cabeças das mariposas, pousadas em todos os lugares.

A certa altura, uma ratoeira se desarmou, e ouvi o chiado da ratazana agonizante. As demais ratazanas também ouviram, e nenhuma ratoeira mais foi desarmada.

Algum tempo depois, cedi ao sono, e dormi alheia ao que se passava em torno.

No dia seguinte, encontrei incontáveis corpos de mariposa decepados, sob a rede, nos demais aposentos, na varanda, e nas calçadas. A casa silenciosa em nada lembrava o movimento noturno incessante. À tarde, tomei o ônibus de volta para a cidade, antes que os ratos voltassem do campo, para mais uma sessão noturna...

Minha coragem, afinal, não chegava à condição de insanidade... Menos mal.



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