Comecei a executar o projeto Livros Pássaros. A bem da verdade, no último período da seca, eu já havia iniciado, mas de forma precária, sem sistematização. Eu apenas deixei alguns livros numa praça, sem mensagem, sem voltar depois para saber se teriam alçado voos ou não.
Do que se trata? Minha casa é habitada por muitos livros. A maior
parte dos quais, depois de terem sido lidos, depois de terem integrado
pesquisas diversas, já não são usados. Os temas de pesquisa mudaram. Os referenciais
teóricos também. As interlocuções passaram a reivindicar outros pontos de vista. Por isso,
decidi libertar esses livros das gaiolas de armários e prateleiras, onde ficam,
hibernados, sem encontrar com quem conversar.
Na Praça Honestino Guimarães, popularmente conhecida como
Praça Universitária, há um bom tempo, um senhor organiza pequenos totens de pedra,
pedaços de tijolos ou cimento. Os totens se encontram em toda a extensão da
praça, debaixo de árvores, nos canteiros, ao lado das esculturas de artistas
reconhecidos. De aparência frágil, muitas pessoas passam, desmontando os
totens. Mas, no dia seguinte, eles estão lá, reconstituídos, ocupando outros
espaços. Se a estrutura dos totens é frágil, podendo ser facilmente desmontada,
a capacidade de reconstrução demonstrada pelo senhor que os organiza é enorme, bem como a
força sutil que o move nesse projeto.
Decidi, então, dialogar com os totens de cimento, construindo
totens com os livros nas mesmas áreas por eles ocupadas. Dentro de cada um dos livros, deixo uma mensagem para quem os venha
a encontrar:
Quando terminei de organizar o segundo grupo de livros, na praça, e fui me afastando, uma jovem passou por perto, diminuiu o passo, ficou olhando. Depois seguiu. Perguntei se ela tinha se interessado pelos livros. De longe, respondeu que tinha achado curioso. Falei que ela poderia olhar e tomar algum que lhe interessasse, se quisesse. Ela voltou, olhou os livros enquanto conversamos. Tinha interesse por livros de literatura. Eu não tinha deixado nenhum, nessa leva. Prometi que, no próximo grupo, levaria alguns de literatura. Contou que é estudante de medicina, que passa por ali todos os dias. Disse também que já viu o senhor organizando os totens de tijolos, mas nunca lhe ocorreu conversar com ele. Da próxima vez, vai conversar.
Seguimos, cada uma, nossos caminhos. Os livros pássaros já
começaram a produzir efeitos. Que sigam livres em seus voos.
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