Queria construir explicações para o momento, como fazem
tantos teóricos, como ensaiam pesquisadores... De nada serviriam. As explicações
construídas sobre a experiência em curso não explicam, de fato: elas tentam dar
algum alento, talvez apontem alguma salvação, talvez nos digam que não
sobreviveremos, mas não foi por nossa culpa.
Elas não explicam, nem mostram saídas. Talvez porque não
haja saídas...
As explicações tão somente reiteram nossas posições prévias,
reafirmam nossos sistemas de crenças. As explicações, em lugar de nos ajudar a
ver, aprofundam a dificuldade de perceber o que quer que seja um pouco além do
que permite nossa miopia antropocêntrica...
Tenho medo. De que? Da morte? Difícil dizer que não seja da
morte. Mas não estou certa de que seria. Talvez pareça arrogância de minha
parte, mas olho no espelho e, no fundo dos meus olhos refletidos, não vislumbro
que eu tenha medo da minha morte. Tenho, sim, medo da morte à minha volta, me
rejeitando, e ceifando os demais. Tenho medo da dor, do desamparo, da
desesperança. Tenho medo do odor fétido do ódio, da crueldade que rege as ações
de governantes e demais lideranças políticas e econômicas.
Pela rua, um rapaz passa, em sua bicicleta. Vai desatento,
pelos poucos carros que circulam. Há bem pouco tempo havia mais movimento, e
muitas vozes se deslocavam animadas pelas calçadas. Um vento fresco atravessa a
casa. Deixo-lhe janelas e portas abertas. Queria que arejasse esta tristeza...
Preciso fazer alguma coisa. E tudo à minha volta repete:
sim, precisamos fazer, com urgência; e o que temos a fazer é exatamente não
fazer...
O medo pede tão somente meu silêncio. Nenhum gesto a mais, qualquer um que seja.
No mais, estou triste. E é tudo.
Gwavira Gwayá
Planalto Central do Brasil,
Segundo dia do outono de 2020, sexto dia de reclusão
continuada.
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