Quando o primeiro dentinho de leite ficou molinho, minha mãe me ensinou a acompanhá-lo, forçando, aos poucos, para que se soltasse mais rápido, até o momento de puxá-lo com firmeza e ele ser arrancado – por mim mesma. Depois, de costas para a casa, eu deveria jogar o dentinho para cima do telhado, falando assim:
Seu ratinho, seu ratão
Leve este dente podre,
Traga um outro bom.
Assim foi com todos. Ou melhor: quase todos.
Confiante no meu desempenho na retirada dos dentinhos de leite, minha mãe não percebeu que um deles não ficou mole, sequer caiu. De minha parte, também não me importei com o fato. Muitos anos mais tarde, eu já estava na universidade, um dentista me olhou enquanto eu sorria e me perguntou o que eu fazia tendo, ainda, um dente de leite.
Exames, radiografias, mapeamento da situação. O dente definitivo ficara ocluso à altura do nariz. Perdera força de impulso para empurrar o outro. Ou seja: era preguiçoso... O outro, pequenino e lampeiro, continuava cumprindo suas tarefas quotidianas. Pensou-se, à época, que se a arcada fosse levemente movimentada, talvez o dente preguiçoso despertasse e resolvesse movimentar-se. Usei aparelho dentário durante dois anos, e nada. Uma cirurgia mais radical poderia trazê-lo à luz a fórceps. Eu preferi manter meu dentinho de leite.
Décadas depois, aqui está ele: meu canino direito superior, um pouco menor que os demais, de coloração um pouco mais escura. Firme, inabalável. Reminiscência de minha infância. O que me ajuda a permanecer um pouco criança através dos anos.
professora, muito lindo seu texto e como você transmite suas recordações...
ResponderExcluirgrande bju!!
um beijinho para você também, Raquel!
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